São Paulo, segunda-feira, 27 de setembro de 2010

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Jovens gregos tentam a sorte no exterior


Crise econômica inicia "fuga de cérebros" no país

Por NIKI KITSANTONIS

ATENAS - Alexandra Mallosi, 29, em breve fará as malas e trocará o tranquilo bairro ateniense de Holargos por Abu Dhabi, onde vai trabalhar como gerente de vendas num hotel. Não foi uma decisão fácil. Sua experiência na hotelaria grega a deixou frustrada. "Em outros países, os jovens são estimulados", disse Mallosi. "Na Grécia, eles são contidos."
Como Mallosi, um crescente número de jovens com curso superior está deixando a Grécia, porque a recessão está sufocando um mercado de trabalho já debilitado por uma arraigada cultura do "quem indica". E a perspectiva de uma virada não é boa. A dívida nacional, estimada em 300 bilhões(euros), é superior ao PIB grego, sugerindo que o país terá anos de austeridade fiscal pela frente.
Segundo uma pesquisa publicada em agosto, 7 em cada 10 gregos com diploma universitário gostariam de trabalhar no exterior. E 4 em cada 10 estão procurando emprego fora ou fazendo cursos que possam lhes abrir portas no mercado internacional de trabalho.
As cifras oficiais mais recentes mostram que o desemprego entre gregos de 15 a 24 anos foi de 29,8% em junho, em comparação aos cerca de 20% de toda a União Europeia.
Para as pessoas de 25 a 34 anos, o desemprego na Grécia passou de 11,8% em junho de 2009 para 16,2% neste ano. A taxa geral subiu de 8,6% para 11,6%.
Yannis Gio, 22, se mudou em julho para Londres. "Eu não conseguia achar emprego [na Grécia] porque não tinha conexões privilegiadas", disse.
Gio está aguardando as respostas de três empresas que o entrevistaram em Londres, e já agendou mais entrevistas para outros empregos lá e também em Paris e Pequim.
Profissionais experientes também estão indo embora, como é o caso de Alexis Cohen, 35. Sua carreira de dez anos como engenheiro de som foi a pique nos últimos meses, porque cantores e músicos, seus clientes, estão fazendo menos shows. Ele já marcou entrevistas de emprego na Califórnia.
"Se você quer ter uma vida decente, não dá para ser aqui", disse. "Sempre foi difícil. Agora está quase impossível."
Nas décadas de 1950 e 60, milhares de gregos partiram em busca de uma vida melhor nos EUA, Austrália e outros países da Europa. Nas prósperas décadas de 1980 e 90, depois da adesão à União Europeia, muitos voltaram.
Mas a festa acabou. Em 2008, os primeiros sinais de recessão apareceram. Neste ano, a crise da dívida exigiu que a Grécia buscasse 110 bilhões(euros) em garantias de empréstimos do FMI e da União Europeia, que em troca exigiram vários cortes orçamentários.
Agora, parece que o país está à beira de uma nova onda de emigração, com os recém-formados na linha de frente.
"Hoje, as pessoas que deixam a Grécia não vão lavar pratos em Astoria", disse George Pagoulatos, professor-associado na Universidade de Economia e Negócios de Atenas, referindo-se a um bairro de imigrantes em Nova York. "Eles são alunos de pós-graduação em Nova York, escolhendo ficar e trabalhar lá."
Pode haver uma "fuga de cérebros" se jovens talentosos virem poucas perspectivas na Grécia, afirmou. Mas ele também manifestou dúvidas sobre as chances desses jovens em outros países ocidentais onde o desemprego também é um problema.
Alexander Kentikelenis, 26, é formado em relações internacionais na Universidade de Atenas e tem mestrado em desenvolvimento internacional na Universidade de Cambridge, na Grã-Bretanha, para onde deve voltar no final do mês, para começar um doutorado em sociologia. Sua ambição original de entrar na política grega foi abandonada. "Percebi que o sistema favorece consistentemente os bem relacionados em detrimento dos talentosos", disse.
Dados da OAED, a agência governamental de empregos, mostram que 600 mil recém-formados entraram no mercado de trabalho nos últimos 15 anos, mas só 250 mil vagas foram criadas, a maioria no inchado setor público. Mas até mesmo esses empregos estão escasseando, porque o governo congelou as contratações, e as empresas estão reduzindo algumas operações ou transferindo-as para fora do país.
Outro problema, segundo um estudo realizado por economistas, é que a maioria das vagas no setor privado é para trabalhadores com qualificação média, e não para egressos das faculdades.
"Dois terços dos formandos nas universidades estão se contentando com empregos que costumavam ir para os que têm diplomas do ensino médio", disse Ilias Kikilias, coautor do estudo. E os trabalhadores desqualificados enfrentam a concorrência não só dos formados em curso superior, mas também de imigrantes dispostos a menores salários.
A criação de mais cursos profissionalizantes seria útil, segundo Glenda Quintini, autora de um relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico sobre o desemprego entre jovens gregos. Mas a maioria dos economistas concorda que a emigração dos jovens gregos só irá diminuir quando os problemas econômicos estruturais forem resolvidos, e o crescimento for retomado. A questão é quanto tempo isso irá levar.
"As reformas não vão começar a dar resultados antes de 2012", disse Pagoulatos. "Com toda essa incerteza, quantos jovens gregos vão esperar dois anos?"


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