São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

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ENSAIO

JAMES TRAUB

Inclinação de Obama ao engajamento produz resultados mistos

Se há uma palavra que descreve a conduta de relações exteriores no primeiro ano de Barack Obama como presidente dos EUA é "engajamento". O governo Obama se envolveu com Irã, Rússia, Mianmar, Sudão, Coreia do Norte.
Mas o que, na verdade, Obama tem a mostrar como "engajamento"? É uma abreviatura para "conversar com seus inimigos", ou pelo menos com países com que se tem profundas diferenças.
Em debate em julho de 2007, os então candidatos democratas foram questionados se, "sem condições prévias", eles conversariam com líderes de países com os quais os EUA mantêm relações hostis. Obama disse: "Eu conversaria", lamentando o fato de Bush não ter feito isso.
Hillary Clinton chamou a resposta de "irresponsável e ingênua". Essa continua sendo a opinião de muitos conservadores enquanto a política se desenrola, mas especialistas em política externa centristas e progressistas, de modo geral, aplaudem a política do envolvimento.
O engajamento pode falhar com seu objeto imediato, mas ainda assim reformular o clima da opinião pública; pode ter sucesso para aquecer relações congeladas, mas a um custo que não vale a pena.
Se de fato Obama despachou autoridades graduadas para conversar com seus homólogos nos países mais autoritários, na esperança de que tratá-los com respeito mudará seu comportamento, até agora os fatos provaram que ele é ingênuo.
Tentativas de tirar o veneno das relações entre EUA e Irã não tiveram efeito sobre o programa nuclear de Teerã, ou seu patrocínio ao terrorismo. Os norte-coreanos continuam intransigentes de maneira similar, bem como Mianmar e Sudão.
Para alguns conservadores, portanto, "engajamento" soa como um eufemismo para "concessões". Max Boot, membro sênior do Council on Foreign Relations, afirma: "Há uma percepção em todo o mundo de que Obama está avançando agachado para os inimigos [dos EUA], e eles estão nos rejeitando com desprezo". Onde, então, no último ano, o envolvimento realmente promoveu os interesses dos EUA?
O Irã é, ao mesmo tempo, o caso mais importante e o mais contestado. O envolvimento aqui pareceria ter sido um fracasso -mas só se você tomar a política totalmente por seu valor de face. Uma autoridade graduada do governo diz sob condição de anonimato que, enquanto a oferta de engajamento "nunca foi só um instrumento ou uma manobra", e continua sobre a mesa, o próprio esforço público para esgotar todos os meios de persuasão ajudou a mover Europa, Rússia e China para uma posição mais dura.
"O Irã tinha aliança com Rússia e China", ele disse, "e eles estavam em confronto com o Ocidente. Essa não é mais a dinâmica". Se o Irã continuar resistente, ele agregou, "continuo convencido de que teremos uma solução que a Rússia apoie".
Mas a mudança é bastará para superar a histórica resistência da Rússia a sanções, e para ameaçar suas relações comerciais com o Irã? "Pode me chamar de cético", diz o escritor neoconservador Robert Kagan. Ele concorda que a diplomacia aumentou a probabilidade de uma ação dura, mas observa que o envolvimento em si não pode modificar os cálculos básicos de interesse nacional. "Os russos sabem que os iranianos estão tentando construir uma arma nuclear e não se importam", diz.
Rússia /Irã pertence ao topo da lista do envolvimento. O mesmo vale para as relações dos EUA com o Conselho de Segurança (CS) da ONU. Susan Rice, embaixadora americana na ONU, diz que a política de envolvimento "criou uma mudança em termos da disposição e abertura dos países a cooperar [com os EUA]". Ela cita as sanções impostas à Coreia do Norte, a resolução de não proliferação aprovada na sessão do CS presidida por Obama, em setembro, e uma recente sintonia fina de medidas contra Al Qaeda e Taleban.
Talvez o Sudão esteja quase no fim da lista. A diplomacia paciente raramente funciona com Estados que ignoram a opinião internacional. Ainda assim, até os defensores mais rígidos dizem que atores externos não têm alternativa além de buscar uma solução política com que o regime possa conviver.
Portanto, o envolvimento tem duas faces: busca oferecer até ao regime mais impiedoso "a opção de uma porta aberta", como disse Obama. Também oferece uma espécie de moeda diplomática.
Talvez, então, a medida do sucesso da política de engajamento será a extensão em que a boa vontade gerada por Obama inclinará a balança na difícil barganha que seu governo tem pela frente, uma questão em que o bem global se choca com as questões mais básicas de interesse dos EUA. O crédito que Obama conquistou terá de se estender por um longo percurso.


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