São Paulo, segunda-feira, 29 de novembro de 2010

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DIÁRIO DO CAIRO

O Islã na luta pelos direitos dos animais

Refeição ritual mancha de vermelho as ruas do Cairo

Por ROBERT F. WORTH

CAIRO - Nunca é fácil ser um ativista dos direitos dos animais no mundo árabe. Mas no Eid al Adha -a festividade religiosa islâmica que mancha as ruas de vermelho com o sangue de cordeiros, vacas e camelos abatidos- isso é um pesadelo.
"Ah, não posso suportar", gritou Amina Abaza. "O islã é todo compaixão, mas não a praticamos!"
A agitada Abaza, 55, há uma década, faz campanha para que os animais sejam poupados ou, pelo menos, abatidos com métodos mais humanos.
O cenário no bairro proletário de Sayyida Zeinab, em 16 de novembro, era bastante típico: camelos urravam enquanto açougueiros encharcados de sangue derrubavam dúzias de animais no chão e cortavam seus pescoços, para admiração da multidão.
Moradores saíam à janela para ver e aplaudir ou para tirar fotos com o celular.
Crianças metiam a mão no sangue e besuntavam umas às outras; adolescentes ajudavam a retirar as tripas ainda fumegantes das carcaças. Pisoteando o sangue coagulado, muita gente se aglomerava para comprar a carne recém-abatida para a refeição ritual dessa data.
Para a maioria dos muçulmanos, a celebração é um momento feliz, com um tema caridoso. Conforme a tradição, um terço da carne abatida é dado a parentes, e um terço aos pobres.
É um bom presente no Egito, onde a carne está ficando mais cara, inacessível a muitas famílias.
O que incomoda Abaza e outros ativistas não é o princípio do Eid al Adha, a Festa do Sacrifício -que celebra a passagem em que Deus autoriza Abraão a abater um carneiro em vez do seu próprio filho. Eles, tampouco, se opõem ao abate de animais propriamente dito (Abaza não é vegetariana).
Eles se queixam é de que muitos açougueiros não seguem nem as próprias escrituras islâmicas: que o animal não deve ser maltratado e não deve ver ou ouvir outros animais sendo mortos.
"Se você quiser dar uma boa imagem aos muçulmanos e ao Alcorão, para que fazer isso?", disse Abaza. "Por que nós, muçulmanos, é que somos conhecidos por esse tipo de comportamento?"
Abaza e um contingente pequeno, mas crescente, de colegas já colhem resultados.
Em 2006, ela ajudou um repórter australiano a filmar um abatedouro com uma câmera escondida.
A reportagem causou escândalo na Austrália, e, logo depois, o governo de lá suspendeu o embarque de ovelhas vivas para o Egito.
"As pessoas acham que estamos atacando o islã", disse ela. "Acusam a gente de ser americano, judeu, maçom."
Quando ela criou, em 2001, a sua organização, chamada Sociedade para a Proteção dos Direitos dos Animais no Egito, sua retórica era, em grande parte, emprestada de grupos similares ocidentais.
"Então, descobri que há direitos dos animais no islã", afirmou ela. "Quando começamos a usar os argumentos islâmicos, eles não nos atacaram tanto."


Colaboraram Dawlat Magdy e Scott Nelson, do Cairo, e Hwaida Saad, de Beirute


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