São Paulo, segunda-feira, 29 de novembro de 2010

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VIVER: A ERA DA INFORMAÇÃO

Estudiosos humanistas, através do digital, iluminam a vida

Por PATRICIA COHEN

A próxima grande ideia em letras, história e artes talvez seja a informação digitalizada.
Os integrantes de uma nova geração de humanistas digitalmente qualificados argumentam que é hora de começar a explorar como a tecnologia está mudando nosso entendimento das artes liberais.
Pesquisadores fazem o mapeamento digital de campos de batalha para entender o papel que a topografia exerceu na vitória, empregam bancos de dados para rastrear como colaborações musicais influenciaram o jazz e fazem buscas em livros e textos científicos para rastrear onde conceitos apareceram pela primeira vez e como foram difundidos.
Dez países europeus embarcaram em um projeto que se propõe a digitalizar dados sobre artes e humanidades.
Essa aliança de nerds e poetas vem gerando entusiasmo, mas também ansiedade. Afinal, as ciências humanas lidam com questões impalpáveis ligadas à estética, à existência e ao significado, com palavras que provocam lágrimas, além de melodias que nos assombram. Será que é possível mensurar esses elementos?
"As humanidades digitais fazem coisas fantásticas", disse o historiador Anthony Grafton, da Universidade Princeton.
Para enxergar o que estudiosos digitalizados podem aprender e que seus antecessores não aprenderam, a Fundação Nacional para as Humanidades e a Fundação Nacional de Ciências, nos EUA, formaram parcerias no ano passado com instituições do Canadá e Reino Unido para criar o Desafio Escavando nos Dados.
Como explicou Brett Bobley, diretor do escritório de ciências humanas digitais da Fundação Nacional para as Humanidades, a análise de volumes inusitados de dados pode trazer à tona padrões e tendências, além de suscitar questões inesperadas que merecem ser estudadas.
Como exemplo, Bobley citou o projeto genoma humano: "A tecnologia não apenas tornou mais eficientes a astronomia, biologia e física -ela deu condições aos cientistas de fazer pesquisas que, antes dela, simplesmente não tinham meios de fazer".
Bobley disse que "humanidades digitais" é um termo amplo que cobre uma grande gama de atividades, desde preservação on-line e mapeamento digital até garimpagem de dados e o uso de sistemas de informação geográfica.
Trabalhando com colaboradores nas universidades de Stanford e Oxford, Dan Edelstein, professor associado de francês e italiano em Stanford, está mapeando o fluxo de ideias durante o iluminismo. Os grandes pensadores da era -Locke, Newton, Voltaire- trocaram dezenas de milhares de cartas.
Uma revelação surpreendente proporcionada pelo projeto Mapeando a República das Cartas foi a escassez de correspondência entre Paris e Londres, disse Edelstein.
"Poderíamos imaginar que, se a Inglaterra fosse essa fonte de liberdade e tolerância religiosa, houvesse um interesse contínuo maior vindo dela", disse ele.
Segundo Tom Scheinfeldt, diretor administrativo do Centro de História e Novas Mídias da Universidade George Mason, em Fairfax, Virgínia, a academia ingressou em "era pós-teórica".
O "momento metodológico" atual, disse, é semelhante ao final do século 19 e início do século 20, quando acadêmicos estavam preocupados em cotejar e catalogar as informações trazidas pelas revoluções nas comunicações, nos transportes e na ciência.
A busca de uma maneira de coletar, abrigar e interligar mais de 350 anos de erudição motivou o medievalista Martin K. Foys, da Universidade Drew, em Madison, Nova Jersey, a criar um mapa digital da tapeçaria de Bayeux, uma tapeçaria gigante bordada no século 11 e exposta em um museu de Bayeux, França, retratando a batalha de Hastings, na qual os normandos conquistaram a Inglaterra. Com 68 metros de comprimento, a obra é grande demais para que qualquer pessoa consiga isoladamente digerir o volume enorme de informações que contém. Assim, Foys criou uma versão digital premiada, com comentários, que estudiosos podem vasculhar no computador.
Seu projeto mais recente é uma rede on-line de mapas e textos medievais sobre os quais vários estudiosos podem trabalhar simultaneamente, analisando e comparando dados quantificáveis sobre imagens e fontes.
"Dispomos de todo um conjunto novo de ferramentas que não são dominadas pela palavra escrita", disse Foys. As humanidades digitais são algo tão novo que seus praticantes, com frequência, se surpreendem com o que aparece.
Quando o conjunto das obras publicadas de Abraham Lincoln foi postado on-line, alguns anos atrás, o diretor do Papers of Abraham Lincoln, Daniel W. Stowell, se surpreendeu ao descobrir que os maiores usuários do site eram os editores do "Oxford English Dictionary".
Eles vinham procurando os documentos para identificar as primeiras instâncias de uso de palavras determinadas.
"As pessoas vão usar estes dados de maneiras que ainda nem sequer imaginamos", disse Stowell, "e acho que esse é um dos avanços mais instigantes no estudo das humanidades."


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