São Paulo, segunda-feira, 30 de agosto de 2010

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CIÊNCIA & TECNOLOGIA

Navio histórico ganha reforço da tecnologia

Por WILLIAM J. BROAD

MYSTIC, Connecticut - Os construtores da embarcação já morreram há muito tempo, levando consigo seu conhecimento. O estaleiro nem existe mais. Não sobrou esboço ou maquete do navio.
Mas o Charles W. Morgan ainda está aí -o último grande navio baleeiro de madeira do mundo, construído em 1841. E os restauradores estão gastando US$ 10 milhões para transformar essa peça de museu em um barco capaz de singrar os mares bravios.
Construído em New Bedford (Massachusetts), outrora considerada a capital baleeira do mundo, o Morgan viajou o planeta durante oito décadas em busca dos leviatãs, escapando de incêndios e de canibais, de invasores confederados e do gelo do Ártico.
Ele levou aos EUA milhares de barris de óleo de baleia, que iluminaram lares e cidades, e várias toneladas de barbatanas, usadas em espartilhos e em chicotes para carruagens.
Em 1941, ano do seu centenário, o Morgan foi rebocado até o museu Mystic Seaport, para ser aberto a visitação, e em 1966 o barco foi declarado patrimônio histórico nacional.
Para aprender o máximo possível sobre o velho navio e assegurar o sucesso da sua restauração, os especialistas estão recorrendo à arte e à ciência das imagens.
Eles empregam equipamentos a laser, máquinas portáteis de raio-X, laptops, câmeras e gravadores, e também legistas, historiadores e artistas gráficos, para destrinchar os detalhes ocultos da construção e da atual condição do navio.
O projeto, iniciado em 2008, está produzindo um retrato revelador. Ele mostra a localização exata e o status de milhares de tábuas, cavernas (as "costelas" do barco), longarinas, pregos, pinos de reforço, prendedores de madeira e outras partes vitais do Morgan.
"Quando acabarmos, ele estará tão ou mais forte do que na última vez em que foi para o mar", disse Quentin Snediker, diretor do estaleiro local. "Então, por que não navegar com ele?"
Um especialista disparando raios-X na quilha -uma maciça coluna vertebral de carvalho, com várias partes e mais de 27 metros no total- caçou os enormes pinos de bronze que mantêm a peça unida. Os pesquisadores pretendem reforçar ou substituir os pinos que, 169 anos depois de instalados, apresentem sinais de deterioração. Cada pino tem de 30 a 60 centímetros.
Numa análise ainda mais detalhada, os especialistas passaram feixes de laser em todo o barco, por dentro e por fora, para registrar detalhes imperceptíveis e criar um arquivo digital sobre suas medidas exatas.
A varredura a laser, capaz de detectar detalhes de até 3 mm, abrangeu todo o navio, que mede 34,7 m x 8,5 m.
O trabalho gerou "milhões de pontos de informação" e um rico acervo de imagens tridimensionais, disse Kane Borden, coordenador de pesquisa da restauração. "Os resultados são bastante espetaculares de se ver."
Os historiadores dizem que a restauração, apesar de toda a sua sofisticação tecnológica, é fundamentalmente uma forma de lembrar e honrar o passado. O Morgan é o último representante de uma frota de quase 2.700 navios baleeiros americanos, que colocaram o então jovem país no mapa e nutriram sua ascendente economia.
"O escopo e a escala disso é algo de que as pessoas não fazem ideia hoje", disse Matthew Stackpole, funcionário do Mystic Seaport. "Era a primeira vez que a presença dos EUA era sentida ao redor do mundo."
O Morgan foi construído no estaleiro de Jethro e Zachariah Hillman, e seu nome alude a Charles Waln Morgan, seu primeiro proprietário, um "quaker" de Filadélfia.
No ano da sua viagem inaugural, 1841, outro navio partiu de New Bedford, levando consigo um aspirante a escritor chamado Herman Melville. Sua experiência baleeira resultou em "Moby Dick".
O Morgan completou 37 viagens a partir de suas bases em New Bedford e San Francisco e foi mais longe do que qualquer outro baleeiro americano. Perto de uma ilha remota do Pacífico, os tripulantes pegaram em armas para afastar canoas cheias de canibais.
Ao longo das décadas, os arpoadores da embarcação apanharam mais de 2.500 baleias, que, depois de serem desmembradas e terem a gordura fervida, renderam mais de 50 mil barris de óleo.
Se tudo correr como planejado, o Morgan ganhará novos cordames no final de 2012. No ano seguinte, no começo do verão boreal, se o clima estiver bom, o baleeiro zarpará do seu píer de granito e voltará a navegar com o vento batendo na sua popa.
O objetivo é visitar lugares da Nova Inglaterra significativos para a atividade baleeira, como New Bedford.
"Ele o último da sua espécie", disse Stackpole. "Queremos que seja uma coisa viva, em vez de um velho artefato empoeirado."


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