São Paulo, segunda-feira, 31 de agosto de 2009

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Cultivo menor de tâmaras reflete declínio iraquiano


Agricultura some, e petróleo domina economia do Iraque

Por TIMOTHY WILLIAMS

BAGDÁ — O final de julho e começo de agosto é a época da colheita de tâmaras no Iraque, quando o sol do deserto transforma esferas verdes em frutos macios, dourados e doces.
Mas há crescentes dúvidas na capital iraquiana sobre se ainda faz muito sentido cultivar tâmaras —ou, aliás, qualquer coisa.
Até a década de 1980, o Iraque era autossuficiente em trigo, arroz, frutas, legumes, ovinos e aves. Exportava produtos têxteis e de couro, além de aço e cimento. Mas guerras, sanções, má administração, competição internacional e retirada de investimentos fizeram de todos os setores uma sombra do que já foram. Lentamente, a economia do Iraque se tornou inteiramente baseada nas importações e em uma única commodity.
Segundo o economista Ghazi al Kenan, 95% da arrecadação do governo vem do petróleo. “E, embora esteja tentando atrair investimentos no setor privado, o Iraque se encontra em circunstâncias dificílimas —sem eletricidade e maquinário suficientes e com uma seca.”
A agricultura tem sido particularmente afetada, e provavelmente não há lugar onde isso fique mais aparente do que nos pomares de tâmaras. As tamareiras foram deixadas para morrer por falta de água, e fungos e pestes já arruinaram toneladas de frutas, porque o Iraque só tem três aviões de pulverização e três pilotos qualificados para o trabalho.
Mesmo os agricultores mais prósperos estão sofrendo. Faraoun Ahmed Hussain, 62, herdeiro de uma família cultivadora de tâmaras e chefe da agência governamental que supervisiona a produção do fruto, disse que seus 25 hectares em Bagdá têm hoje a menor produção de que se tem lembrança. “Eu poderia colocar mais dinheiro nisso, mas a situação não encoraja”, disse. “Sob circunstâncias normais, o dono de uma propriedade dessas seria um homem riquíssimo.”
O Iraque, que já produziu 75% das tâmaras do mundo, agora ficou atrás de Egito, Irã e Arábia Saudita. No ano passado, o país produziu 255 mil toneladas, segundo o Ministério da Agricultura, cerca de metade do nível de meados da década de 1980.
O número de fábricas processadoras de tâmaras caiu de 150 —antes da invasão norte-americana de 2003— para 6. As tâmaras iraquianas agora são embaladas nos Emirados Árabes Unidos, a quase 1.400 km de distância.
Ainda assim, as tâmaras continuam sendo um alimento básico no Iraque, valorizadas por sua capacidade de permanecer frescas sem refrigeração. Servem como fonte de nutrição e para usos tão variados como a produção de álcool e ração animal.
Hussain é o senhor de um pomar outrora próspero, mas hoje descuidado, que a sua família possui desde 1910, às margens do rio Tigre. Em tempos normais, cada palmeira poderia produzir 60 a 80 kg de frutos por ano. No ano passado, cada árvore deu menos de 15 kg. Muitas das 4.000 palmeiras estão claramente doentes.
Como o dinheiro que Hussain recebe por sua safra do Ministério do Comércio, que compra a maior parte dos produtos agrícolas do Iraque, às vezes é inferior ao custo da produção, ele não tem mais investido muito na fazenda. Nenhum dos seus filhos quer saber do negócio familiar. Ele disse que o pomar irá quase certamente morrer junto com ele. “Será vendido”, afirmou, dando de ombros. “Será doloroso para mim que isso aconteça, mas cumpri meu dever para com minha família e minha tradição. Não há nada mais a fazer.”


Colaborou Mohammed Hussein


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