São Paulo, segunda-feira, 31 de agosto de 2009

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Um rapper ácido, direto de Marrocos


‘‘Eu me vejo como um embaixador ou um jornalista e tento chegar às pessoas que não leem jornais’’
MUHAMMAD BAHRI
rapper de Casablanca que se apresenta como Barry


Por STEVEN ERLANGER
e SOUAD MEKHENNET

CASABLANCA, Marrocos — Ele é tratado como um príncipe em Hai al Mohammadi, um bairro de favelas, mercados, imigrantes e operários marroquinos. Ele também lutou, desde os 15 anos, para abandonar esse bairro, cantando com um dos primeiros grupos marroquinos de rap, o CasaMuslim.
Muhammad Bahri, 29, se orgulha do bairro —que teve papel essencial na resistência popular ao colonialismo francês no Marrocos—, e as pessoas dali se orgulham dele. Elas lhe dão tapinhas nas costas, lhe pagam cafés, perguntam de seus pais e do seu recente casamento e comentam sobre os problemas do local —a pobreza, a polícia, as drogas nos arredores, seus filhos.
Mas não tem sido uma caminhada muito fácil para Bahri, cujo nome artístico é Barry. Suas canções políticas lhe causaram problemas, e alguns shows seus foram interrompidos.
Na música “Driss”, ele criticava Driss Basri, que foi ministro do Interior do país entre 1979 e 99. Basri era considerado a mão de ferro do rei Hassan 2°, mantendo a ordem por meio de prisões, repressão e tortura.
“Driss era um agricultor que virou policial”, canta Bahri. “Dissemos a ele para ficar de olho no bastão, e aí ele nos bateu com aquilo. Basta, basta, basta desse bastão.”
“As pessoas ficaram bastante chocadas com isso”, disse ele numa recente entrevista, rindo. “Mas com cada álbum tento fazer uma música que choque as pessoas.”
Basri foi demitido em 1999 pelo atual rei, Muhammad 6°, e se exilou em Paris, onde morreu em 2007.
Uma canção como “Driss” teria sido impossível sob o reinado de Hassan 2°, disse Bahri. O rei Muhammad 6° atenuou as restrições à imprensa e à cultura popular, mas dentro de limites que incluem críticas ao rei e à monarquia.
Sob o rei Hassan 2°, recordou Bahri, era difícil dizer qualquer coisa, de modo que os músicos criaram um tipo de música popular chamado “chaabi”, semelhante ao “raï” argelino, que aproveita melodias tradicionais. Atualmente há canções com misturas mais modernas e um conteúdo mais forte. “Agora é possível latir aqui, mas suavemente”, disse Bahri.
Em 2003, radicais islâmicos explodiram uma série de bombas em Casablanca, matando 45 pessoas e ferindo centenas. “Houve muitas prisões, e muita gente foi colocada na cadeia sem ter nada a ver com nada, mas tivemos um problema de células da Al Qaeda aqui”, comentou o músico.
Sua reação foi escrever uma canção tendo como alvo a Al Qaeda, chamada “Quem São Vocês?”
“Vocês fizeram terrorismo, foi um presente para Bush”, canta ele, referindo-se ao ex-presidente dos EUA George W. Bush (2001-2009). “Vocês falam de resistência, mas são monstros domados. Se vocês entendessem o Corão, não haveria bombas.”
Mas ele também escreveu uma música atacando a política internacional de Bush, chamada “Johnny Walker Bush, li man habbouch [aquele de quem não gostamos]”. “O sangue de cada árabe não basta para mim”, canta ele. “Que ambicioso! Nós o mandamos para o inferno.”
Bahri deixou o bairro há cinco anos, mas tenta continuar em contato com seus pais e amigos que vivem ali, em parte para coletar o material que fará suas canções ecoarem. Muitos pobres de Marrocos são analfabetos, e ele acredita que suas músicas podem educá-los.
“Eu me vejo como um embaixador ou um jornalista e tento chegar às pessoas que não leem jornais”, disse.


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