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São Paulo, domingo, 01 de junho de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

O governo e o poder

RIO DE JANEIRO - A desculpa mais esfarrapada que anda por aí para explicar a dicotomia entre o antigo PT e o novo chega a ser cínica: o Partido dos Trabalhadores, criado nos subterrâneos da resistência democrática, coberto de glórias na luta sindical, que logo contaminou a sociedade inteira, chegou ao governo, mas não chegou ao poder.
Com palavras bastante parecidas, todos os partidos que chegaram ao governo disseram a mesma coisa, de forma até mais radical. Vargas suicidou-se dizendo que não pudera fazer tudo o que desejava pelo povo. FHC pediu que o compreendessem: como professor na oposição, ele tinha uma visão; como presidente eleito duas vezes, fora obrigado a adotar a visão que antes combatera.
O que está faltando ao PT, e a Lula principalmente, é a coragem de poder. Coragem que Vargas teve, no segundo mandato, dobrando o salário mínimo, mas nunca se dobrando ao capital internacional, e criando a Petrobras, numa jogada de mestre, convencendo a oposição a fazer o que ele queria.
JK foi outro que chegaria ao governo sem chegar ao poder. Bastaria compor com a oposição, com aqueles que lhe negavam o direito de ser presidente. Enfrentou duas rebeliões militares, foi combatido e insultado pela quase totalidade da mídia, rompeu com o FMI e ainda teve tempo para dançar, cantar e se divertir, mas fez o Brasil crescer 50 anos em cinco.
É bem verdade que Vargas se suicidou e que JK foi cassado e exilado. Eles exerceram o poder não como governantes ou estadistas, mas como homens. Homens, como os machistas costumam dizer, com H maiúsculo.
Era isso o que se esperava de Lula. Afinal, ele não foi para o governo obliquamente, como alguns vice-presidentes, que são obrigados a herdar um cenário criado por outro. Foram os casos de Sarney e de Itamar, que chegaram ao governo, mas não chegaram ao verdadeiro poder.
Se Lula e o PT acham que não chegaram ao poder, o que estão fazendo lá em cima?


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