|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Editoriais
editoriais@uol.com.br
Receita duvidosa
O Código de Ética Médica, o
Conselho Federal de Medicina, a
Agência Nacional de Vigilância
Sanitária e até um código de condutas da Associação da Indústria
Farmacêutica de Pesquisa proíbem o recebimento de benefícios
-dinheiro, brindes, viagens- em
troca da prescrição de medicamentos específicos.
Não há carência de regulamentos, portanto, a condenar relações
promíscuas entre médicos e fabricantes de remédios ou equipamentos hospitalares. Apesar das
normas, 93% dos médicos paulistas obtiveram algum tipo de vantagem da indústria.
O dado veio à luz em pesquisa
do Cremesp (Conselho Regional
de Medicina) realizada com 600
profissionais. A amostra é representativa dos cerca de 100 mil médicos do Estado de São Paulo.
É verdade que, dos que recebem
visitas de propagandistas, só 48%
terminam por prescrever o medicamento por eles promovido. Mas
a mera presença do representante
da indústria no consultório projeta uma sombra de suspeita sobre a
relação médico-paciente, que deveria primar pela confiança.
A sondagem evidencia a falta
de clareza sobre os limites éticos
da profissão. Ao mesmo tempo em
que a maioria dos médicos aceita
os mimos, 52% dos ouvidos concordam que devam ser proibidos
de receber qualquer tipo de brinde, presente, bem material ou
apoio financeiro, em todas as situações. Ou seja, são muitos os
que praticam aquilo que, na sua
opinião, deveria ser banido.
De um lado e de outro desse balcão, a justificativa mais usada para as investidas promocionais é a
difusão de informações científicas
para atualização do profissional.
Trata-se de um argumento falacioso, senão hipócrita.
Em primeiro lugar, com a internet a literatura médica está ao alcance de todos os que têm acesso
a um computador. Se até pacientes leigos se valem dela, por que
não o fariam seus clínicos?
Depois, as pesquisas compiladas pelos departamentos de marketing dos laboratórios serão fatalmente enviesadas. Apenas os
resultados favoráveis ao produto
do fabricante ganharão destaque.
O médico que se fiar nelas estará
traindo a obrigação primeira de
buscar o melhor tratamento para
quem lhe confia sua saúde.
Boas regras não faltam. Falta o
passo seguinte: obedecê-las.
Texto Anterior: Editoriais: Ataque em alto-mar Próximo Texto: São Paulo - Fernando de Barros e Silva: A vida como negócio Índice
|