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Apagão estratégico
ROBERTO LUIS TROSTER
Em vez de mais um apagão, se tomadas as medidas devidas, a alta do petróleo se refletirá em uma fonte
de riqueza para o país
H
Á ALGUMAS semanas, o preço
do petróleo ronda o seu recorde histórico, originando preocupações sobre seu impacto na economia mundial. Na última quinta-feira, ao bater a segunda maior cotação
histórica combinada com anúncios de
problemas no mercado imobiliário
dos EUA, as Bolsas no mundo inteiro
tiveram quedas recordes. Seria um sinal de reversão nos fluxos para países
emergentes: risco-país disparando,
Bolsas despencando, juros em alta e
uma reversão no crescimento econômico. Levantaram-se temores infundados de um apagão financeiro.
O termo apagão vem da crise do setor elétrico em 2001, em razão dos
cortes e racionamentos de luz. Foi o
resultado de anos de descaso no setor
de energia. A política para esse campo
era de reações a problemas circunstanciais, e não de planejamento de
longo prazo.
Não pensar no futuro custou caro.
Há mais apagões: aéreo, da infra-estrutura, do Judiciário, dos portos, da
estrutura agrária, da segurança, da
saúde pública, da educação, do Orçamento, da legislação trabalhista, da
inserção externa e da política.
Apesar dos apagões, a economia
brasileira deve crescer cerca de 4,5%
neste ano, sem inflação, com o câmbio se apreciando, com os juros caindo e com a Bolsa de Valores batendo
recordes de alta. A causa é um quadro
econômico mundial e interno sem paralelos no passado.
O mundo vive um novo paradigma,
com outros desafios. A estabilidade
macroeconômica, as novas tecnologias, os ganhos de produtividade e a
maior abertura comercial e financeira deram uma nova dinâmica às economias. Mesmo com a desaceleração
dos Estados Unidos, a economia
mundial deve crescer 5,2% neste ano,
com destaque para a China, crescendo 11,5%, a Rússia, 7%, e a Índia, 9%.
Nesse quadro, uma alta do preço do
petróleo tem impactos negativos na
economia norte-americana, mas é benéfica, em vez de prejudicial, à economia brasileira. Quanto mais caro forem os combustíveis fósseis, melhor
para o país.
O Brasil tem uma vantagem competitiva nos biocombustíveis reconhecida mundialmente. O Pró-Álcool
foi desenvolvido por ocasião do primeiro choque do petróleo. A cadeia
produtiva do álcool brasileira -preparação da terra, formação de mudas,
plantio, colheita, refinação, armazenamento, desenvolvimento de motores etc.- é a mais sofisticada da atualidade. O mundo está acordando para
os biocombustíveis, enquanto o Brasil está três décadas à frente.
Nesse sentido, as ações necessárias
para consolidar o Brasil como pólo
mundial de biocombustíveis já estão
diagnosticadas: padronização mundial de sua produção; investimentos
em pesquisa; um programa de estocagem apropriado; um regime de comercialização adequado; um tratamento tributário justo; investimentos em pesquisa e tecnologia; um monitoramento contínuo da matriz
energética mundial; e um gerenciamento sistêmico do projeto.
Em vez de mais um apagão, se tomadas as medidas acima, a alta do petróleo se refletirá em uma fonte de riqueza para o país.
Se por um lado os apagões não eram
esperados, há também surpresas positivas no cenário brasileiro, alguns
clarões: a demanda por biocombustíveis, a elevação do preço de algumas
exportações brasileiras, uma abertura comercial internacional maior, novas tecnologias, o crescimento mais
rápido do mundo, há uma abundância
de recursos à procura de investimentos produtivos no mundo -enfim,
oportunidades para alavancar o crescimento abundam.
O novo paradigma mundial combinado com o quadro macroeconômico
interno permite melhorar ainda mais
o desempenho econômico do país.
Para tanto, temos que eliminar o
apagão estratégico. Décadas de volatilidade econômica nos tornaram hábeis e criativos para enfrentar crises e
apresentar soluções heterodoxas.
Mas não conseguimos planejar bem.
Os apagões são exemplos dessa falta de visão de longo prazo. O Brasil
pode crescer e se desenvolver muito a
médio prazo, mas se foca apenas em
resolver as questões mais imediatas e
as considerando como permanentes.
Países que planejam conseguem
evitar apagões. A capacidade de desenvolvimento do Brasil é grande e há
condições de prosperidade que não
devem mais ser desperdiçadas.
Para isso, é necessário pensar sistematicamente no futuro e nos especializarmos em antecipar problemas, em
substituição à miopia atual. Há um
horizonte promissor que deve ser
usufruído.
ROBERTO LUIS TROSTER, 56, doutor em economia pela
USP, foi economista-chefe da Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), da ABBC e do Banco Itamarati.
robertotroster@uol.com.br
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