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CARLOS HEITOR CONY
Um caso pessoal
RIO DE JANEIRO - Passou discretamente pela mídia o 45º aniversário do golpe de 64. Houve reunião
em alguns centros militares, muita
troca de mensagens eletrônicas.
Aos poucos, os herdeiros ou sucessores daquele movimento começam a expor "o outro lado" da questão, que, em geral, continua contada apenas pelo lado dos vencidos,
mais tarde vencedores no plano da
história, bem verdade que à custa
de milhares de vítimas.
Um dado importante vem sendo
destacado nas manifestações que
procuram justificar o regime de arbítrio instaurado na movediça data
de março/abril daquele ano. A sociedade dita civil apoiou com entusiasmo o golpe, houve euforia nas
ruas, nas igrejas e na totalidade da
mídia. No dia seguinte à tomada do
poder pelos militares, publiquei
uma crônica no finado "Correio da
Manhã" em que gozava o aparato
bélico que ocupou o último reduto
da legalidade, o forte de Copacabana, onde se esperava uma reação
contra os golpistas.
O jornal havia combatido com
violência os últimos dias do governo de João Goulart. Quando cheguei à redação naquele dia, todos
esperavam a minha demissão. Carlos Drummond de Andrade, que estivera comigo na véspera, assistindo à rendição do forte, ligou-me
preocupado, pensando que eu já estava no olho da rua -abrigo tradicional dos desagradáveis.
Como não houve demissão, no
dia seguinte escrevi outra crônica,
bem mais violenta, sem tom de gozação. Pouco depois, fui processado
pelo ministro da Guerra, expulso
como mau elemento do sindicato
dos jornalistas, tive de pedir demissão. Estava contra a opinião pública, da qual a imprensa era a porta-voz.
O caso pessoal dá razão ao reparo
que os militares estão fazendo sobre 1964. Em seu início, o movimento teve o apoio entusiasta da
mídia e da sociedade.
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