São Paulo, sexta-feira, 02 de junho de 2006

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NELSON MOTTA

Portugal tropical

LISBOA - Passeando pelas calçadas de pedras portuguesas da avenida da Liberdade, sob um suave sol de verão, me vieram à cabeça velhos versos de Chico Buarque, em plena ditadura Médici, quando cantava, com tristeza e sarcasmo, em "Calabar": "Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal / ainda vai tornar-se um imenso Portugal", na época, salazarista, isolado e obscurantista. A poesia era boa, mas a profecia não se concretizou, Portugal mudou.
Depois da Revolução dos Cravos, nós continuamos na ferradura e invejamos os irmãos do ultramar. Chico cantou por nós, com esperança:
"Sei que há léguas a nos separar / Tanto mar, tanto mar / Sei, também, quanto é preciso, pá / Navegar, navegar".
Cruzando o Rocio e admirando a beleza de Lisboa e a estabilidade, o progresso e a liberdade de Portugal, voltei a pensar na profecia de Chico e me diverti com a idéia de que, como está Portugal, até que não teria sido mau negócio...
Quem poderia ter seguido a inspiração do poeta é seu amigo Fidel Castro, tornando Cuba -que tem a mesma população e mais recursos naturais- um Portugal tropical. Aqui, ninguém passa fome, os desempregados e aposentados têm seus direitos respeitados, ninguém morre por falta de médico ou de remédios, há escola para todos, ótimas universidades, salários dignos. Plenas liberdades democráticas.
Nesses 30 anos em que Cuba foi ajudada pela União Soviética para construir o socialismo, e Portugal pela União Européia para construir uma democracia, os resultados são conhecidos. Nem na saúde pública e na educação, de que tanto se orgulha, Cuba conseguiu resultados melhores do que Portugal. E sacrificou os sonhos e a liberdade de várias gerações.
E ainda há quem queira nos tornar uma imensa Cuba.


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