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CLÓVIS ROSSI
A bola e a escola
FRANKFURT - No Brasil é quase
sempre assim: em vez de debater
um argumento, qualquer que seja,
prefere-se qualificar (ou desqualificar) quem o apresentou.
Está acontecendo agora com o jogador francês Thierry Henry, desqualificado como "racista" ou "invejoso" por ter dito o seguinte:
"Quando eu era pequeno, ia à escola
das 8h às 17h, e minha mãe não me
deixava descer para jogar. Eles [os
brasileiros] jogam das 8h às 18h!".
Exagero talvez, mas nada de fundamentalmente errado.
A frase deveria é provocar uma
discussão sobre a diferença no sistema educacional do mundo rico e
do Brasil.
Basta ler os dados que a repórter
Letícia Sander apresentou na Folha de ontem: os alunos brasileiros
do ensino fundamental não conseguem "pontuação adequada" em
nenhum dos itens avaliados.
Mais: "Cinqüenta pontos separam o desempenho dos alunos de 4ª
e 8ª série. É como se, hoje, os alunos
de 8ª série tivessem conhecimentos
dos de 4ª série, se comparados com
índices internacionais".
No fundo, bem lida a pesquisa, ela
dá razão a Henry. O brasileiro é melhor na bola do que na escola.
Ou porque joga o dia inteiro ou
por uma propensão natural que deveria ser mais bem pesquisada.
Mais importante, no entanto, seria corrigir a defasagem educacional. Não adianta rigorosamente nada ganhar o hexa se os alunos da 8ª
série continuarem com nível educacional de 4ª série.
Mas a frase de Henry remete
também à França: filhos de imigrantes, como ele, também têm no
futebol sua melhor chance de ascensão social, mesmo que estudem,
como ele, das 8h às 17h. A revolta
dos subúrbios é a prova.
O mundo se tornou mais cruel e
menos simples do que sonha nossa
contínua fuga aos fatos.
crossi@uol.com.br
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