São Paulo, sexta, 2 de outubro de 1998

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PAGAMOS E NÃO TIVEMOS

"Na verdade, nunca tivemos US$ 70 bilhões. Concretamente, as reservas estavam em torno de US$ 50 bilhões", afirma Francisco Lopes, diretor de Política Monetária do Banco Central. Essa instituição, entre outras funções, administra os dólares que entram no país e zela pela manutenção de quantidade adequada dessa moeda no caixa nacional.
É com esses dólares que, por exemplo, o país paga os produtos que importa e os juros que deve. O resto do mundo não aceita reais. O Brasil consegue moeda forte, em geral dólares, exportando ou recebendo investimentos estrangeiros. Quando não obtém o bastante para cobrir essas despesas externas, o governo pode emprestar dinheiro, pagando juros para atrair capital. Quando, além de faltarem dólares, há desconfiança sobre o vigor da economia de um país, é preciso pagar juros ainda maiores. É o caso do Brasil de hoje.
Lopes, o diretor do BC, parece afirmar que foi à toa que parte do caixa de reservas foi cevado a juros altíssimos. O capital assim atraído não atenderia às necessidades de pagamento ou de credibilidade do país.
Na verdade, as reservas também são um esteio da estabilização de preços. Há controvérsia a respeito de qual seria o nível adequado de dólares no estoque. Ou sobre qual a proporção prudente na composição desse caixa: quanto de empréstimos, quanto de investimentos. O que há de certo é que manter reservas tem um custo que, no atual modelo econômico, se reflete no explosivo aumento da dívida e do déficit públicos.
Num país de maiores rigores legais, com um Congresso mais atuante, Lopes e seu superior, Gustavo Franco, presidente do BC, seriam ao menos convidados a explicar por que se pagou por reservas voláteis.
Não seria a primeira oportunidade que Lopes oferece ao Congresso. Em março, admitiu que o governo intervinha nos mercados financeiros, sem que ficasse clara a natureza dessas operações. Há pouco, convidou investidores a seguirem seu exemplo e comprarem papéis na Bolsa. Em outras paragens, seria um escândalo de promiscuidade uma autoridade monetária agir como consultor financeiro. Espera-se que algum parlamentar tire o Congresso de sua letargia e pelo menos debata com os funcionários do BC a política de administração de reservas. Voláteis ou não, elas custam caríssimo ao país.



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