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Quatro vidas
LUIZ CAVERSAN
Rio de Janeiro - Cláudio tinha 36
anos, duas filhas e fazia aniversário
naquele dia. Mas era perito criminal e
tinha que trabalhar. Perito criminal é
aquele especialista glamouroso dos filmes americanos, mas que no Brasil
serve para constar, na maioria dos casos. Chega à cena do crime depois de
todo mundo, quando as provas, indícios e pistas já foram prejudicados pela inabilidade dos policiais.
Mas Cláudio foi fazer seu trabalho,
aliás com a própria motocicleta, porque o carro da perícia está quebrado
há três meses. Tinha que examinar as
circunstâncias de um homicídio, num
lugar barra-pesada da Baixada Fluminense.
Quando chegou lá, o corpo já tinha
sido levado embora pelo rabecão. Mas
a bandidagem local estava por ali.
Cláudio foi executado com seis tiros.
O espanhol Manoel Barca, o Manolo, se preparava para voltar ao país de
origem. Depois de 42 anos de Brasil, ia
deixar o restaurante do Alto da Boa
Vista e retornar a La Coruña em tempo de assistir à festa de São Vicente.
Mas o santo de Manolo não era forte: três assaltantes entraram no estabelecimento e recolheram a féria do
dia. Foi quando apareceu Alexandre,
guardador de carros, surdo e mudo.
Ele se assustou e assustou os bandidos,
que dispararam para todo lado.
Uma bala atingiu a nuca de Manolo, matando-o.
Margarete mora em Bangu, mas agita uma bandeira com o nome de Fernando Henrique e Moreira Franco na
Visconde de Pirajá, Ipanema. Está ganhando R$ 5 mais o lanche. Bom demais. Havia três meses que Margarete
não conseguia trabalho algum. Por
ela, agitava bandeira, de qualquer
candidato, o resto da vida.
Emerson pede trocados pelas ruas do
Leblon. A roupa molhada da chuva o
deixa ainda mais magro, raquítico.
Por isso mesmo, as pessoas se condoem
mais, e as esmolas aumentam. Apesar
do frio, ele sorri, inexplicavelmente
com todos os dentes perfeitos. "O movimento tá bom demais hoje."
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