São Paulo, terça-feira, 02 de novembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OS EUA VÃO ÀS URNAS

Os norte-americanos vão hoje às urnas para escolher seu próximo presidente. Não se sabe se conseguirão. Há indícios de que poderá repetir-se o fiasco do pleito de 2000, quando um virtual empate na Flórida e as batalhas jurídicas que se seguiram levaram a eleição a ser decidida em favor de George W. Bush pela Suprema Corte federal.
Como ocorreu quatro anos atrás, as pesquisas indicam uma disputa extremamente equilibrada. Em seis Estados é impossível arriscar até mesmo uma tendência. O problema não está em eleições acirradas. Elas acontecem em muitos países e não chegam a constituir um desafio à democracia. A questão é que o complexo sistema eleitoral norte-americano, fruto de um país que se formou a partir de uma confederação de Estados, tende, nessas condições, a exacerbar as possibilidades de impasse.
Como as eleições nacionais nos EUA são, na realidade, uma série de pleitos estaduais simultâneos, multiplicam-se por 51 (para efeitos de eleição presidencial, o Distrito de Colúmbia funciona como um Estado) as chances de que ocorram resultados próximos o bastante para poderem ser contestados judicialmente.
Todos os Estados, por ora com exceção de dois, adotam a regra de que o vencedor leva consigo para o colégio eleitoral a totalidade dos votos a que a unidade tem direito, o que torna vantajoso, no caso de quase-empates, recorrer ao Judiciário.
Diferenças estreitas, que se afigurem reversíveis numa eventual recontagem determinada pela Justiça, podem dar ou tirar de um dos postulantes o cargo eletivo mais importante do mundo.
Por fim, a absoluta ausência de parâmetros comuns para a contagem dos votos -os sistemas de votação e apuração não variam apenas de Estado para Estado, mas também de condado para condado- dá substância jurídica para as reclamações. Diferentes critérios podem ser interpretados como uma violação ao princípio da igual proteção dos cidadãos diante da lei, inscrito na 14ª emenda à Constituição dos EUA.
O quadro de extrema polarização entre os partidos, cada qual considerando que uma vitória do adversário será capaz de comprometer o futuro do país, permite antever que nenhuma das partes deixará de utilizar-se de todos os recursos jurídicos possíveis para conquistar a Presidência.
A essa altura, antes mesmo do início formal das eleições, tanto republicanos quanto democratas já despacharam exércitos de advogados e fiscais para os Estados onde a contenda desenha-se mais dura. Alguns procedimentos jurídicos até mesmo foram iniciados, contestando os critérios para o registro e a recusa de eleitores. Prevê-se que outros serão abertos em diferentes Estados depois de contados os sufrágios.
A melhor chance de evitar a repetição do trauma de 2000 seria uma vitória contundente de algum dos candidatos, mas, a crer nas pesquisas, esse é um dos poucos cenários que se podem excluir do pleito de hoje.
Não deixa de ser irônico que uma das mais sólidas democracias do planeta continue às voltas com um sistema eleitoral que pode emperrar seu funcionamento justamente quando a sociedade se divide ao meio.


Texto Anterior: Editoriais: O NOVO MAPA POLÍTICO
Próximo Texto: Miami - Clóvis Rossi: Emoções x realidades
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.