São Paulo, quinta-feira, 02 de dezembro de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

Senso de oportunidade

BRASÍLIA - Em 1986, o governo que deveria ser de Tancredo Neves e era de José Sarney estava uma bagunça, ninguém se entendia. E, apesar de líder do governo, o senador Fernando Henrique Cardoso surfou na onda: em entrevista ao "Jornal do Brasil", ele arrasou o governo, chamando o ministro do Planejamento, João Sayad, de "confeito de bolo".
FHC deu azar. A entrevista foi publicada no mesmo dia em que Sarney lançou o Plano Cruzado, a mais sensacional jogada econômica e de marketing daquele momento. O senador ficou falando sozinho, fora de hora.
É mais ou menos o que ocorreu nesta semana. O sociólogo racional e elegante incorporou um candidato passional e extemporâneo e chamou o governo de "incompetente", mirando diretamente Lula: "O rei está nu".
FHC deu azar novamente. Sua fala foi publicada na terça-feira e, no mesmo dia, o IBGE informou que o Brasil cresceu 5,3% nos primeiros nove meses deste ano. Foi o melhor desempenho no mesmo período desde 1995 -ou seja, melhor do que nos dois mandatos tucanos.
FHC falou da ação de governo como um todo e atraiu a ira das várias tendências do PT e de aliados governistas de todos os tipos, inclusive dos que são tão ou até bem mais raivosos do que ele próprio contra a política econômica -de resto, tão parecida com a sua. Num misto de vencedor e de vítima, Palocci tripudiou ao cobrar mais "elegância" de FHC.
Algumas conclusões: 1) está na hora de FHC aprender quando falar o quê; 2) o principal flanco do governo Lula não é a economia, mas a ausência de programas, a falta de rumo na área social, o mau gerenciamento, a brigalhada e a inabilidade política; 3) apesar disso, é a economia, e não o resto do governo, que realmente conta para definir cenários e candidaturas para 2006.
Ou seja: o governo é sofrível, mas, se a economia cresce e os empregos aparecem, a reeleição de Lula continua sendo a aposta mais segura. E FHC pode falar o que quiser, mas não vai pagar para ver.


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