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SEM EUFEMISMO
A comunidade internacional
tem em mãos um tenebroso
documento de 244 páginas com o relato minucioso de 70 mil mortes, a
expulsão de 1,8 milhão de pessoas de
suas terras e o uso do estupro como
arma de guerra. Esse impressionante
conjunto de atrocidades ocorreu na
região de Darfur, no Sudão, país africano cujo governo está empenhado
desde o início de 2003 numa sórdida
operação de limpeza étnica, que não
tem alcançado a devida repercussão
possivelmente pelo fato de o foco das
atenções internacionais estar voltado
para o Iraque, as relações entre Israel
e palestinos e o terrorismo islâmico.
Apesar das abundantes evidências
de crimes contra a humanidade, o relatório, realizado por cinco enviados
das Nações Unidas e divulgado anteontem, não fala em genocídio. Já o
secretário-geral da ONU, Kofi Annan, afirmou que a caracterização do
genocídio deveria ser feita por uma
corte internacional.
Essa corte, como se sabe, já existe.
É o Tribunal Penal Internacional, para o qual a França e o Reino Unido
querem encaminhar para julgamento os membros do governo sudanês
e suas milícias, opção objetada pelos
Estados Unidos, que não reconhecem a legitimidade daquele foro.
A verdade precisa ser dita com todas as letras. Ocorreu e continua a
ocorrer genocídio. É preciso que o
Conselho de Segurança da ONU defina sanções contra o governo do Sudão para que sua política de extermínio deixe de ser uma ferramenta para
determinar o direito à posse e ao cultivo de escassas terras aráveis.
O resto é eufemismo, é hipocrisia,
é discussão acadêmica em torno do
alcance da Convenção de Genocídio
de 1948. É também o descarado
oportunismo de Washington ao negar autoridade a um tribunal internacional simplesmente por temer que
seus próprios militares possam nele
um dia se tornar réus.
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