São Paulo, quarta-feira, 03 de fevereiro de 2010

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RUY CASTRO

Escala desumana

RIO DE JANEIRO - No meio de tanta beleza arquitetônica, volta e meia surge no Rio uma enquete perguntando qual é o prédio mais feio da cidade. Vários costumam ser citados, mas o favorito não paga dez: é a Catedral Metropolitana, na avenida Chile, desde 1976 colada aos Arcos da Lapa. Vista de fora, lembra um balde emborcado, um escorredor de macarrão ou uma usina nuclear. As descrições variam, mas a sensação de horror é constante.
Minha principal ojeriza ao monstro é que ele acanalhou os Arcos, que, na sua inauguração como aqueduto, em 1744, deram de beber ao Rio e, com seus modestos 17 m, eram a maior construção das Américas, da altura de um prédio de cinco andares. Mas a arcaria de pedra e cal ficou nanica ao lado dos bufos, estapafúrdios 96 m da Catedral, equivalentes a um prédio de 32 andares. Aonde chegam a vaidade e a prepotência de um arquiteto?
O entorno dos Arcos, compreendendo o casario da Lapa, o convento de Santo Antonio e o morro de Santa Teresa -tudo parte do patrimônio histórico da cidade-, parece o alvo preferencial dos megalôs. Ali já estão a sede da Petrobras (sempre citada em segundo na eleição do prédio mais feio), o prédio do BNDES e a vastidão inóspita, hostil, estilo Brasília, da avenida Chile.
O ataque ao patrimônio recrudesceu por esses dias com a ameaça de construção de mais dois espigões na área: um anexo de 14 andares ao BNDES e a nova sede da Eletrobrás, com seus 44 andares. Isso numa cidade cheia de espaços, como a avenida Presidente Vargas, aberta nos anos 1940 para receber esse tipo de construção, e a zona portuária, que implora por empreendimentos.
Algumas pessoas que respeito e, bem sei, amam o Rio, têm seus argumentos para defender os espigões. Mas sou careta, gosto de prédios na escala humana, e ainda não me convenceram.


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