São Paulo, sábado, 03 de abril de 2004

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MARCOS AUGUSTO GONÇALVES

A imaginação no poder

SÃO PAULO - A inscrição da política na lógica publicitária de mercado não é nenhuma novidade. Candidatos, governos, programas sociais e hambúrgueres se equivalem no mundo encantado da mercadoria. Não é nada estranho, portanto, que peças publicitárias do governo tenham ido ao ar mostrando situações mais enganosas do que seria lícito esperar.
Como esta Folha noticiou, um anúncio destinado a vender os resultados de investimentos governamentais em agricultura familiar mostrava uma verdejante área de plantio de uma propriedade privada, que jamais recebeu um tostão furado do programa agrícola em questão.
Esse tipo de artifício é corriqueiro na publicidade. A atriz que aparece linda na cozinha de casa recomendando isso ou aquilo está num estúdio encenando uma situação que nada ou muito pouco tem a ver com seu cotidiano. Tudo fica melhor nos filmes. Locações estrategicamente escolhidas podem até fazer de São Paulo uma sólida e bela capital européia.
Não vejo motivo para o governo se preocupar tanto com isso a ponto de ter retirado a campanha do ar. Tudo, afinal, é um tanto enganoso no universo marqueteiro. Por que então não explorar os recursos disponíveis? Por exemplo: por que não usar o Fasano como locação de um anúncio do Fome Zero? Talvez soasse um pouquinho artificial, é verdade. Mas, e daí? Ficaria um luxo.
E que tal uma paisagem suíça, com crianças uniformizadas, para enaltecer os feitos da educação petista? Um pouco de neve ao fundo, nos picos alpinos, daria o necessário toque civilizatório. E não há razão para descartar os bancos de dados. Imagens de arquivo podem ter imenso valor publicitário. Uma fábrica fordista, por exemplo, como aquelas de "Tempos Modernos", se bem colorizada no computador, resultaria em apropriada e dinâmica ambientação para os progressos do Primeiro Emprego.
Enfim, sejamos criativos, companheiros. Como pediam em 68: a imaginação no poder!


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