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VALDO CRUZ
Língua solta
BRASÍLIA - Nos últimos dias, o Brasil tinha dois presidentes. Um estava na Europa. O outro, no Palácio do Planalto. Talvez influenciados pelo clima de continentes diferentes, os dois
não estavam falando a mesma língua no dia de ontem.
Da capital, o presidente José Alencar acionou mais uma vez sua metralhadora verbal contra os juros altos.
Quebrando um voto de silêncio que
se auto-impusera quando estivesse
substituindo Lula, defendeu que a
decisão sobre os juros tem de ser política, não técnica.
De Genebra, o titular mandou seu
recado: não se baixam juros com bravatas. Elogiou Antonio Palocci, aquele que prefere o caminho técnico ao
político, arrematando que seu ministro da Fazenda chega a ser mais
equilibrado do que ele.
Será que Lula quis dizer que seu vice está perdendo o equilíbrio? Parece
que não. As entrevistas dos dois companheiros, separados pelo Atlântico,
foram quase simultâneas. Não foi
uma resposta pensada.
O presidente, porém, anda incomodado com o estilo nada mineiro de
José Alencar. As críticas do vice estão
trazendo para dentro do governo
uma polêmica que Lula gostaria de
ver bem distante do Planalto.
O petista sabe que seu vice não faz
as críticas para desgastá-lo. Mas seus
insistentes ataques podem passar a
imagem de que só ele defende os juros
baixos no governo, enquanto Lula e
Palocci ficam do lado oposto, numa
posição mais conservadora.
O bombardeio do vice desagrada
ainda mais ao presidente porque ele
também se considera insatisfeito com
a demora na queda dos juros. Só que
está convencido de que o caminho de
Palocci é o correto e seguro.
José Alencar conhece a posição de
Lula sobre o assunto. Mas não pretende abrir mão de sua cruzada. Defende um debate público sobre os juros altos até que eles caiam. Verbaliza a posição do empresariado.
Seu risco é ficar alijado do centro de
decisão. Por sinal, há gente próxima
a Lula que defende "isolamento-já".
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