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Tragédia anunciada e evitável
PAULO MALUF
Fazer alguma coisa para clarear o caos aéreo que aí está exige providências que possam
ser executadas já. Como as aqui propostas
MUITO JÁ se disse depois da
tragédia com o Airbus da
TAM em Congonhas. Uma
lástima, no entanto, é que só agora se
discuta o que deve ser feito para mudar o quadro que aí está. Que idéias
em enorme quantidade apareçam só
depois do ocorrido -algumas idéias
absurdas, outras viáveis.
O que aconteceu em Congonhas foi
uma tragédia anunciada. Ainda bem
que, depois do auge do caos, foi descartada a construção de um novo aeroporto como parte da solução para a
aventura temerária em que se transformou chegar ou sair de São Paulo a
bordo de um avião.
Bom também que um juiz de bom
senso tenha negado o pedido apressado de um promotor do Ministério Público de São Paulo para fechar Congonhas, como se retirar o sofá da sala
fosse o caminho para resolver como
os aviões devem chegar ou sair daqui.
Só para registro: o aeroporto de
Guarulhos (Cumbica) levou 10 anos
para ser pensado, planejado, construído e inaugurado. O quadro de horror que estamos vendo não pode ficar
exposto por tanto tempo, esperando
que o novo aeroporto fique pronto.
Implantar linhas ferroviárias de velocidade rápida para Cumbica ou Viracopos (quanto a Viracopos, o canteiro central da rodovia dos Bandeirantes foi feito exatamente para isso)
é uma solução boa, mas um remédio
de prazo médio. Fazer alguma coisa
para clarear o caos aéreo que aí está
exige providências que possam ser
executadas já. Como estas.
Quem viaja partindo de São Paulo
para países do hemisfério Norte (nove a 12 horas de vôo) ou para o continente asiático (viagem de 24 a 27 horas) pode tranqüilamente gastar 45
minutos, uma hora talvez, até chegar
a Viracopos pela Bandeirantes.
Para viagens nacionais com mais de
uma hora e meia de duração, os aviões
só deveriam operar em Cumbica.
Congonhas, dessa forma, só seria
usado para viagens de curta distância
e pelos jatos da aviação executiva,
usados só quando há urgência.
Aviões de pequeno porte, sem motores de propulsão a jato, só decolariam ou chegariam aqui pelo Campo
de Marte.
São medidas para implementar
imediatamente; e, depois, cuidar de
providências de médio e longo prazo.
Um aeroporto novo para São Paulo,
como foi o caso de Cumbica, começou
a ser pensado em 1975. Vinte e oito
possíveis lugares foram escolhidos
para construí-lo, a maioria inviável.
O governo do Estado e o Ministério
da Aeronáutica acabaram optando
então por escolher a base aérea de
Cumbica, que, além de estar em uma
área plana, estava localizada em terreno em maior parte da União.
O novo aeroporto precisava de 14
milhões de metros quadrados, e havia
na base aérea 10 milhões de metros
quadrados pertencentes ao Serviço
de Patrimônio da União. Ou seja, para
viabilizá-lo, foi preciso fazer desapropriação dos 4 milhões que faltavam.
A região de Cumbica, até então, era
descartada com o argumento de que
havia muita neblina. Esse problema,
contudo, a aviação daquele tempo, começo dos anos 80, já resolvera com o
uso da tecnologia do ILS (Instrument
Landing System), que permite a aproximação segura de aviões -o que era e
é eficiente, como se viu depois, com o
aeroporto operando com segurança.
Cumbica só começou a operar em
1985, com um custo final muito menor do que se previa. Guarulhos é, na
relação custo/benefício, o mais barato aeroporto internacional do mundo.
Um aeroporto com as mesmas dimensões, na cidade de Osaka, no Japão, custou, na mesma época, 20 vezes mais do que o de Guarulhos.
O estudo de todas essas áreas cogitadas para construir o aeroporto de
que precisávamos estão nos arquivos
do Departamento Aeroviário de São
Paulo, subordinado à Secretaria de
Transportes do Estado.
Ampliar Guarulhos, com mais uma
pista e um novo terminal, e melhorar
Viracopos são as outras soluções de
médio e longo prazo, as mais viáveis,
para sairmos do caos em que estamos.
A alegação de que tanto em Cumbica como em Viracopos os entornos foram ocupados por construções irregulares que impediriam as obras de
ampliação é uma justificativa burra.
Fosse assim, não se poderia nunca
construir novas avenidas ou atender
outras necessidades das cidades.
Sempre há como negociar a remoção dessas pessoas, sem violência, por
um preço justo, que seja bom para os
dois lados, cuidando da questão social. Se as pessoas estão lá, é porque o
poder público permitiu, por omissão.
A redistribuição de partidas e chegadas, a ampliação de Guarulhos e
melhorias em Viracopos, a médio e
longo prazo, são as soluções de que
precisamos, sem necessidade de gastar bilhões com a construção de um
novo aeroporto e redirecionando esses recursos para educação e saúde.
A autoridade e a experiência do novo ministro da Defesa, Nelson Jobim,
parecem ser a combinação ideal para
que tudo isso aconteça.
PAULO MALUF, 75, engenheiro, é deputado federal pelo
PP. Foi governador de São Paulo (1979-1982) e prefeito da
cidade de São Paulo (1969-1971, 1993-1996).
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