São Paulo, sexta-feira, 03 de agosto de 2007

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Tragédia anunciada e evitável

PAULO MALUF

Fazer alguma coisa para clarear o caos aéreo que aí está exige providências que possam ser executadas já. Como as aqui propostas

MUITO JÁ se disse depois da tragédia com o Airbus da TAM em Congonhas. Uma lástima, no entanto, é que só agora se discuta o que deve ser feito para mudar o quadro que aí está. Que idéias em enorme quantidade apareçam só depois do ocorrido -algumas idéias absurdas, outras viáveis.
O que aconteceu em Congonhas foi uma tragédia anunciada. Ainda bem que, depois do auge do caos, foi descartada a construção de um novo aeroporto como parte da solução para a aventura temerária em que se transformou chegar ou sair de São Paulo a bordo de um avião. Bom também que um juiz de bom senso tenha negado o pedido apressado de um promotor do Ministério Público de São Paulo para fechar Congonhas, como se retirar o sofá da sala fosse o caminho para resolver como os aviões devem chegar ou sair daqui.
Só para registro: o aeroporto de Guarulhos (Cumbica) levou 10 anos para ser pensado, planejado, construído e inaugurado. O quadro de horror que estamos vendo não pode ficar exposto por tanto tempo, esperando que o novo aeroporto fique pronto.
Implantar linhas ferroviárias de velocidade rápida para Cumbica ou Viracopos (quanto a Viracopos, o canteiro central da rodovia dos Bandeirantes foi feito exatamente para isso) é uma solução boa, mas um remédio de prazo médio. Fazer alguma coisa para clarear o caos aéreo que aí está exige providências que possam ser executadas já. Como estas.
Quem viaja partindo de São Paulo para países do hemisfério Norte (nove a 12 horas de vôo) ou para o continente asiático (viagem de 24 a 27 horas) pode tranqüilamente gastar 45 minutos, uma hora talvez, até chegar a Viracopos pela Bandeirantes.
Para viagens nacionais com mais de uma hora e meia de duração, os aviões só deveriam operar em Cumbica. Congonhas, dessa forma, só seria usado para viagens de curta distância e pelos jatos da aviação executiva, usados só quando há urgência.
Aviões de pequeno porte, sem motores de propulsão a jato, só decolariam ou chegariam aqui pelo Campo de Marte.
São medidas para implementar imediatamente; e, depois, cuidar de providências de médio e longo prazo.
Um aeroporto novo para São Paulo, como foi o caso de Cumbica, começou a ser pensado em 1975. Vinte e oito possíveis lugares foram escolhidos para construí-lo, a maioria inviável.
O governo do Estado e o Ministério da Aeronáutica acabaram optando então por escolher a base aérea de Cumbica, que, além de estar em uma área plana, estava localizada em terreno em maior parte da União.
O novo aeroporto precisava de 14 milhões de metros quadrados, e havia na base aérea 10 milhões de metros quadrados pertencentes ao Serviço de Patrimônio da União. Ou seja, para viabilizá-lo, foi preciso fazer desapropriação dos 4 milhões que faltavam.
A região de Cumbica, até então, era descartada com o argumento de que havia muita neblina. Esse problema, contudo, a aviação daquele tempo, começo dos anos 80, já resolvera com o uso da tecnologia do ILS (Instrument Landing System), que permite a aproximação segura de aviões -o que era e é eficiente, como se viu depois, com o aeroporto operando com segurança.
Cumbica só começou a operar em 1985, com um custo final muito menor do que se previa. Guarulhos é, na relação custo/benefício, o mais barato aeroporto internacional do mundo. Um aeroporto com as mesmas dimensões, na cidade de Osaka, no Japão, custou, na mesma época, 20 vezes mais do que o de Guarulhos.
O estudo de todas essas áreas cogitadas para construir o aeroporto de que precisávamos estão nos arquivos do Departamento Aeroviário de São Paulo, subordinado à Secretaria de Transportes do Estado.
Ampliar Guarulhos, com mais uma pista e um novo terminal, e melhorar Viracopos são as outras soluções de médio e longo prazo, as mais viáveis, para sairmos do caos em que estamos.
A alegação de que tanto em Cumbica como em Viracopos os entornos foram ocupados por construções irregulares que impediriam as obras de ampliação é uma justificativa burra.
Fosse assim, não se poderia nunca construir novas avenidas ou atender outras necessidades das cidades. Sempre há como negociar a remoção dessas pessoas, sem violência, por um preço justo, que seja bom para os dois lados, cuidando da questão social. Se as pessoas estão lá, é porque o poder público permitiu, por omissão.
A redistribuição de partidas e chegadas, a ampliação de Guarulhos e melhorias em Viracopos, a médio e longo prazo, são as soluções de que precisamos, sem necessidade de gastar bilhões com a construção de um novo aeroporto e redirecionando esses recursos para educação e saúde.
A autoridade e a experiência do novo ministro da Defesa, Nelson Jobim, parecem ser a combinação ideal para que tudo isso aconteça.


PAULO MALUF, 75, engenheiro, é deputado federal pelo PP. Foi governador de São Paulo (1979-1982) e prefeito da cidade de São Paulo (1969-1971, 1993-1996).

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