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RUY CASTRO
Mais ritos
RIO DE JANEIRO - Coluna recente, em que falei de certos rituais do
cinema americano do passado -envelopes que se fechavam com uma
simples lambida, cigarros soltos
dentro dos bolsos etc.-, despertou
a memória de meu amigo Celso Arnaldo Araújo, companheiro de
"Manchete" nos anos 70. Ele me
lembrou de outras manias daqueles
filmes.
Por exemplo, quando as balas do
revólver do bandido acabavam, este
jogava o revólver fora. Qualquer
cheque, mesmo de milhões de dólares, era preenchido e assinado perfunctoriamente, em menos de dois
segundos. E, quando as pessoas tinham de vomitar no filme, era sempre com a cabeça enfiada no vaso
sanitário, quase dentro da água,
mesmo que a cena se passasse em
nojentos banheiros de beira de estrada -na época, o cinema ainda
nos poupava de vômitos explícitos.
As ligações telefônicas eram sempre interrompidas abruptamente,
com a pessoa batendo o telefone no
gancho -ninguém dizia um simples "tchau, tchau" ao fim da conversa, mesmo que não estivesse
braba com o interlocutor. E, nos
apartamentos, a campainha tocava,
o herói ia abrir e a visita era sempre
surpreendente -nunca se viu um
porteiro ou interfone nos velhos filmes americanos.
Eu acrescentaria aqueles fósforos
que se acendiam ao ser riscados em
qualquer lugar -na parede, na sola
do sapato e até na careca do coadjuvante. Em 1974, percorri meio EUA
em busca dos tais fósforos, mas não
os encontrei em lugar nenhum.
Assim como eu, Celso Arnaldo vê
com divertida perplexidade esses
ritos de Hollywood -ou de Brasília,
em que, por mais que um político
pinte e borde, não bastam as provas
mais contundentes para classificá-lo como corrupto e justificar sua defenestração. Como nos filmes, exige-se que se faça de conta que tudo
aquilo é normal.
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