São Paulo, sexta, 3 de outubro de 1997.



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HEGEMONIA AUTORITÁRIA

O presidente Fernando Henrique Cardoso pôs o dedo na ferida da grande política internacional ao dizer anteontem, em Santiago do Chile, que a liderança dos Estados Unidos não deve ser hegemônica, mas "algo mais compartilhado".
Pena que, por ser presidente de um país em desenvolvimento, suas palavras críticas tendam a cair no vazio. Na mesma direção, mas de forma muito mais concreta, até pelo peso de seu país, está indo o primeiro-ministro francês, Lionel Jospin.
Jospin lançou um desafio concreto à ilimitada hegemonia norte-americana, ao respaldar o contrato que uma empresa francesa de petróleo assinou com o Irã, um dos países que o governo dos Estados Unidos pretendem manter na posição de pária da comunidade internacional.
Não se trata, aqui, de julgar o regime iraniano, mas de questionar o papel de polícia moral, política e comercial do mundo que os Estados Unidos passaram a arrogar-se, a partir do fato inquestionável de que são a única superpotência que restou no planeta após o colapso soviético.
Com base nessa hegemonia, os EUA acham-se no direito de banir o comércio de seus parceiros com países que consideram inidôneos, casos, por exemplo, do Irã, da Líbia e de Cuba, entre outros.
Por odiosas que sejam as ditaduras vigentes em tais países, o comportamento norte-americano é no mínimo farisaico. Afinal, o regime iraniano do xá Reza Pahlevi não era diferente, em matéria de liberdades, de seus sucessores. Não obstante, os EUA eram os principais parceiros do xá.
Washington chegou até a financiar a derrubada de governos constitucionais, como o de Salvador Allende, no Chile, para ficar no exemplo em que existe a mais abundante comprovação dos mecanismos de desestabilização empregados. Foram, no geral substituídos por ditaduras, com amplo respaldo dos Estados Unidos.
Esse histórico mina a autoridade moral de Washington para determinar quem pode negociar com quem e dá a seu exercício de hegemonia um inequívoco viés autoritário.





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