São Paulo, terça-feira, 03 de dezembro de 2002

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CLÓVIS ROSSI

De ilusões, armadas e perdidas

SÃO PAULO - Ao voltar de viagem, há uma semana exata, encontrei sobre a mesa os dois primeiros volumes de "As Ilusões Armadas", a série de cinco livros de Elio Gaspari sobre o ciclo militar.
Brinquei com o autor ao encontrá-lo no dia seguinte: "Não li e gostei". Sabia que iria gostar, porque Elio Gaspari escreve diabolicamente bem e conta fatos como ninguém.
Bom, agora, ao concluir a leitura do primeiro volume ("A Ditadura Envergonhada"), dá para gostar não só pelo valor jornalístico, historiográfico e literário do livro (o que já foi cantado em prosa e verso por muitos) mas também pela satisfação de verificar que os acontecimentos nele descritos parecem fazer parte não da história do século passado, mas da pré-história do Brasil.
Ou, posto de outra forma: os métodos de fazer política, incluída a violência como arma de terrorismo político, no período estudado estão absolutamente ultrapassados. O Brasil é outro institucionalmente, infinitamente melhor.
Sou capaz de apostar em que não haja chance de volta atrás na evolução institucional do país, embora companheiros da Folha vejam com ceticismo esse meu otimismo.
O Brasil é outro até no caudal de pessoas que passou a fazer parte dos registros eleitorais. Elio lembra, a certa altura, que Jânio Quadros elegeu-se presidente (em 1961) com 5,6 milhões de votos -colhidos, como é óbvio, em todo o país. Em 2002, essa votação seria medíocre (significaria apenas a metade dos votos que Aloizio Mercadante capturou em um único Estado, o de São Paulo, para eleger-se senador).
Não ocorreu apenas a natural evolução demográfica, mas uma real massificação da democracia.
Falta agora o passo seguinte: a democracia de massas dar prova de que é capaz, sim, de resolver o abismo social que só fez ficar maior entre os eventos registrados em "As Ilusões Armadas" e o período de ilusões perdidas que foi interrompido, talvez só momentaneamente, pela vitória de Luiz Inácio Lula da Silva.


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