São Paulo, quinta-feira, 04 de março de 2004

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CARLOS HEITOR CONY

O gênio e a droga

RIO DE JANEIRO - Não fiquei surpreso ao saber que Lula, segundo as últimas pesquisas, em termos de popularidade continua com bons índices. Aliás, sem nenhuma vocação para profeta, já havia comentado o fenômeno há meses: por pior que estejam o governo e o país, Lula continuará sendo o salvador, imune às contingências naturais da carne política. É um mito criado pela maioria do nosso povo. Negá-lo seria negar o próprio povo.
Lembro um tempo em que correu por aí uma frase atribuída ao Paulo Francis sobre o cinema nacional: "O filme é uma droga, mas o diretor é um gênio".
Havia uma disparidade entre o produto e a mística criada em torno dos diretores, todos considerados gênios. Os segundos cadernos da vida provavam exaustivamente a genialidade de todos, não apenas dos diretores mas dos iluminadores, produtores, continuístas, cinegrafistas e até dos motoristas que serviam às equipes. Na hora de a onça beber água, os resultados provavam o contrário.
Com Lula e a sua produção pessoal, que é o governo como um todo, está acontecendo igual disparidade. O presidente é um gênio, santificado pelo seu passado glorioso, como lembrou Clóvis Rossi, nesta semana, fazendo um paralelo entre o ex-presidente do Haiti e o nosso atual manda-chuva, que, aliás, pouco está mandando, embora a chuva esteja fazendo estragos gerais.
Acredito que continuará assim. Tirante a pauta de reivindicações sociais que lhe deram fama e status de messias, Lula só demonstrou habilidade para se preservar no papel de mediador das crises internas do PT e, agora, das crises do governo.
Não me refiro ao último escândalo, que leva o codinome de Waldomiro. No meu entender, a trapalhada não chega a atingir a honorabilidade do poder, nem do Zé
Dirceu, muito menos do Lula. Refiro-me ao escândalo continuado da insensibilidade social e econômica do governo, que é elogiado pelo FMI e começa a ser negado pela nação.


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