São Paulo, domingo, 04 de abril de 2004

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POLÍTICA INDUSTRIAL

Política de estabilização não é sinônimo de política econômica. Todavia, no discurso das autoridades governamentais, e sobretudo na sua prática, há anos esse tem sido o padrão no Brasil. Não é por acaso que os resultados favoráveis no combate à inflação têm sido acompanhados por um ritmo de crescimento da atividade produtiva muito aquém do desejável, com concomitante elevação do desemprego e desgaste do poder de compra da população.
Essa é justamente a razão pela qual deve ser visto com bons olhos o anúncio de uma política industrial, tecnológica e de comércio exterior feito pelo governo federal na quarta-feira -embora não se justifique que o projeto só tenha sido ultimado 15 meses após o início do governo.
Um nível razoável de estabilidade de preços é condição necessária para amortecer as incertezas, tornando o ambiente econômico mais propício ao investimento e, portanto, ao crescimento. No entanto -como esta Folha tem argumentado-, uma taxa de inflação baixa não é condição suficiente para animar os empresários a investir. Isso é ainda mais verdadeiro quando a inflação vai sendo contida por meio da manutenção de taxas de juros altíssimas, com severos prejuízos às condições de financiamento dos investimentos.
A política industrial apresentada pelo governo centra-se no oferecimento de estímulos a quatro setores: bens de capital, software, semicondutores e fármacos. São segmentos com papel central no processo de inovação e na difusão do progresso técnico, além de peso na balança comercial. A intenção é colher frutos a médio e longo prazos na forma de ganhos de produtividade com potencial para influenciar positivamente outros setores da economia.
É fundamental, como previsto, que os estímulos concedidos sejam rigidamente monitorados. Os benefícios devem ter prazos estipulados e os beneficiados precisam cumprir metas e apresentar resultados. O país já pagou caro pela ineficiência gerada por incentivos concedidos de forma descontrolada. A nova política industrial requer também ações coordenadas entre vários ministérios, algo que o governo tem demonstrado dificuldades para praticar. Resta saber ainda se os recursos anunciados efetivamente aparecerão ou se estaremos diante de mais um programa anunciado com pompa para ser rapidamente esquecido.
Se o foco da política industrial parece adequado, ela deveria ser acompanhada por iniciativas específicas voltadas a outros setores, que poderiam render frutos em prazo mais curto. A questão básica, neste campo, seria auxiliar a reestruturação de cadeias produtivas com tradição exportadora (como a da siderurgia e a calçadista) ou que se tornaram altamente deficitárias no comércio exterior (como bens de consumo duráveis, de informática e de equipamentos de telecomunicações), de modo a permitir que o crescimento do mercado interno não redunde numa erosão excessiva do superávit comercial.


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