|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIANE CANTANHÊDE
Sem destino
BRASÍLIA - Quem disse que a novela Bustani acabou?
Se você não se lembra, trata-se do
embaixador brasileiro José Maurício
Bustani, eleito diretor-geral da Opaq
(Organização para a Proscrição das
Armas Químicas) e depois derrubado
ostensivamente pelos EUA.
Um dos motivos, ou o principal deles, é que Bustani vinha levando a sério a missão de reduzir ao máximo as
armas químicas no mundo, atraindo
para a Opaq até países bélicos (e belicosos) como o Iraque e a Líbia.
Os EUA, principais financiadores
da organização -além de donos do
mundo-, não gostaram. Pressionaram e acabaram destronando Bustani, que se ressentiu amargamente de
um sutil, mal disfarçado, lavar de
mãos da diplomacia brasileira.
Sem cargo, sem apoio e danado da
vida, ele segue acusando os norte-americanos de quererem transformar o diretor da Opaq em mero
agente de seus próprios interesses. Ou
seja, Bustani não morreu. Está por aí,
assombrando uns e outros.
A última dele foi uma entrevista à
agência de notícias BBC -que, como
tudo hoje em dia, circula abertamente pela internet e atinge o mundo-,
em que se queixou dos EUA, do Brasil
e até da vida.
Relata ele na entrevista que teve de
fechar às pressas a sua casa em Haia
(Holanda) porque o prazo de seu visto oficial expirava e que hoje está perambulando feito alma penada. Ficou sem casa e sem posto no Itamaraty, onde tudo é um jogo de encaixes
que atende a uma velha lei da física e
da política: um embaixador só entra
quando outro já saiu.
Sem ter onde encaixá-lo, os amigos
providenciaram uma vaga provisória: o Consulado Geral de Londres,
enquanto o cônsul efetivo, Paulo
Campos, está no Brasil a serviço.
O início é zangado, mas o final da
entrevista de Bustani à BBC é melancólico: "Hoje, eu me encontro sem
função, sem casa e sem destino".
O mundo está lendo e vendo. O Itamaraty, em vez de se apiedar, ficou
furioso. Não é linguagem de diplomata, alega. Talvez seja de gente.
Texto Anterior: Buenos Aires - Clóvis Rossi: Fronteiras Próximo Texto: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Conto oriental Índice
|