São Paulo, sábado, 04 de julho de 2009

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RUY CASTRO

Receitas letais

RIO DE JANEIRO - Gay Talese é um escritor americano cujo nome vem sempre associado a expressões de que ele diz não gostar, como "new journalism" e "jornalismo literário". Eu também não gosto. Jornalismo é jornalismo.
Se não contiver informação original e acurada, o "literário" não conseguirá salvá-lo. E seria assim tão novo o "new journalism" criado por Talese, Tom Wolfe e outros na revista "Esquire" nos anos 60? Sem esse nome, os americanos já pareciam praticá-lo 30 anos antes, no jornal "New York World", de Herbert Bayard Swope, na New Yorker" e na própria "Esquire". Mesmo no Brasil dos anos 40, Joel Silveira e Rubem Braga também faziam parecido. Ou será que, antes do "new journalism", toda a imprensa escrevia mal?
Como receita de trabalho, Talese sempre enfatiza a necessidade de o repórter ouvir muita gente e observar o ambiente -se Frank Sinatra não quer falar com você, fale com quem estiver à volta dele e esquadrinhe o cenário. Uma técnica que remonta a Gutenberg, mas, vá lá. O importante é apurar, não pressupor, e só então escrever.
Daí a surpresa ao ler na Folha que, para Talese, "a imprensa matou Michael Jackson". Mas como? Segundo ele, Michael se entregou aos remédios "controlados" porque a imprensa o acusava de abusar sexualmente de criancinhas. É uma afirmação ousada. Talese terá ouvido isso de Michael, do psiquiatra, da enfermeira ou da babá do artista? Ou será uma suposição?
Objetivamente, Michael parecia ser usuário em alta escala dos analgésicos opioides Demerol, OxyContin e Dilaudid, do narcótico Vicodin, do ansiolítico Xanax, do relaxante muscular Soma, do antidepressivo Paxil, do antialérgico Vistaril (que potencializa o efeito dos opiáceos) e do sedativo Diprivan, para anestesia geral. Nem a imprensa pode ser tão letal.


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