São Paulo, quinta-feira, 04 de novembro de 2004

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CLÓVIS ROSSI

Se loucos, são muitos

MIAMI - O mandato dos presidentes norte-americanos, para todos os efeitos práticos, é de oito anos, com um plebiscito no meio dele (na forma de eleição presidencial) para revalidá-lo ou revogá-lo.
Sendo assim, George Walker Bush revalidou o seu mandato na terça-feira. Se houvesse alguma dúvida sobre o caráter plebiscitário do voto, bastaria ler as pesquisas de boca-de-urna: três quartos dos eleitores de John Kerry dizem que, na verdade, votaram contra Bush, e não a favor do candidato democrata.
Nessas circunstâncias, perdem qualquer sentido as considerações sobre a ilegitimidade do mandato de Bush em razão das circunstâncias exóticas, para dizer o menos, em que foi eleito no ano 2000. Não que o exotismo tenha desaparecido, mas o eleitor norte-americano, ainda que por uma leve maioria, avalizou tudo o que houve de lá para cá.
Pode-se e deve-se continuar criticando Bush por suas políticas, mas não se deve cair na ingenuidade de supor que elas são produto de um grupo de tarados que assaltou o poder para pôr em prática idéias extremistas. Ao contrário, Bush é produto de sentimentos profundos na sociedade norte-americana, alguns deles já antigos, outros surgidos a partir dos atentados de 11 de Setembro (de 2001), cujo peso na alma norte-americana vai levar ainda alguns anos para ser devidamente avaliado.
Um dado é revelador: pesquisa recente do Council on Foreign Relations, seção de Chicago, mostra que 29% dos norte-americanos apóiam torturas para extrair confissões de acusados de terrorismo (acusados, não condenados, frise-se).
É a minoria, sim, mas é um número brutal quando se leva em conta a luta pelos direitos civis no país, ainda que, para exportação, os governos norte-americanos pouco se importem com eles.
Por puro palpite, suspeito que Bush será agora menos fundamentalista. Mas a realidade é que, se há loucos na Casa Branca, estão na companhia de quase 60 milhões de norte-americanos, o que é muito dizer.


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