São Paulo, quinta-feira, 04 de novembro de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

O Brasil e o império

RIO DE JANEIRO - Para o mundo, George W. Bush é o presidente americano que invadiu o país alheio sob falsos pretextos e sem ter a menor idéia de como articular a retirada. Para o Brasil, tanto faz Bush ou John Kerry. Ou tanto fazia.
Passada a eleição e confirmada a expectativa de reeleição de Bush, o governo Lula volta à carga para lembrar as diferenças. É por isso, ou também por isso, que Lula deverá fazer discurso amanhã defendendo uma aproximação e um aprofundamento do diálogo dos países latino-americanos com Cuba.
Durante a campanha americana, Planalto e Itamaraty andavam bem caladinhos em público e anunciavam em privado que, apesar das graves divergências, pragmaticamente preferiam Bush. As conversas entre os dois governos vão bem nas questões pontuais de interesse mútuo, e a combinação de uma grande potência com um presidente medíocre é menos agressiva ao equilíbrio internacional.
Passada a campanha, esquecem-se as convergências e os pragmatismos, volta-se à carga. Daí porque Lula aproveita a reunião de hoje e amanhã de 12 dos 19 presidentes do Grupo do Rio (países das três Américas) para lembrar que tem simpatia, sim, por Fidel Castro e quer a aproximação de todos com Cuba.
Ou seja, a intenção é juntar duas circunstâncias, o resultado da eleição americana e a reunião do grupo latino-americano, para reafirmar uma política externa que se pretende "independente" e "pró-ativa".
Para colorir o recado diplomático, está no Rio desde ontem o maior aliado de Cuba e maior adversário de Washington, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Ele vai adorar o discurso preparado por Lula, mas os dois não vão conseguir o consenso. O Grupo do Rio, integrado também por países da América Central solidamente atrelados aos Estados Unidos, é refratário a acenos em direção a Fidel .
É um atraso num mundo globalizado e pragmático, mas Bush é um atraso em si mesmo. Se a maior potência não ouve nem a ONU, por que seu quintal ouviria Cuba?


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