São Paulo, #!L#Sábado, 05 de Fevereiro de 2000


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GENÉTICA DE RESULTADOS

Assim como um dia ocorreu com a química e a eletricidade, a genética já de algum tempo perdeu a condição de simples campo de investigação. A análise do DNA, molécula-código da hereditariedade, tornou-se uma indústria. Por estar na base de todas as biotecnologias, da agricultura transgênica às terapias genéticas, o valor intrínseco da tecnologia cresce de forma exponencial e seu planejamento deixa de pautar-se exclusivamente pela ética científica.
Exclusivamente, é de bom alvitre repetir. Porque a genética não deixou de depender visceralmente da pesquisa básica, quase sempre sustentada por verbas públicas -em especial no Brasil. Não se trata de abandonar o imperativo da publicidade dos resultados da pesquisas, regra inescapável do método científico, mas de reinterpretá-lo à luz da aproximação célere entre laboratórios e mercado.
Tal é o dilema vivido neste momento por um dos projetos mais promissores do país, o Genoma do Câncer. Ele recorre à genômica (sequenciamento, análise e interpretação de genes) para desvendar o funcionamento de tumores. Desse ponto de vista, o da pesquisa de novas formas de diagnóstico, prevenção e tratamento do câncer, é evidente que os dados devem ter divulgação imediata.
Ocorre que as sequências brutas de DNA geradas pelo Genoma do Câncer podem adquirir enorme valor, científico e comercial. Comparando-as com o recém-publicado sequenciamento do cromossomo 22, surge a oportunidade de identificar com precisão genes inteiros.
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e o Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, lideranças do Genoma do Câncer, estudam adiar a publicação das sequências, ou seja, seu depósito em bancos de dados internacionais acessíveis pela Internet. A idéia, que será discutida na próxima semana, é ganhar tempo para que os autores da leitura do DNA possam avançar na sua interpretação.
Recorrendo à feliz imagem do diretor científico da Fapesp, José Fernando Perez, o sentido da iniciativa é impedir que os geneticistas brasileiros se tornem meros exportadores de matéria-prima. Esses dados, brutos, podem ser refinados no estrangeiro e até mesmo patenteados. Como os frutos terapêuticos dessa análise só serão colhidos em anos ou décadas, o período de carência em exame -um ou dois meses- é compatível com ambos os princípios, o desenvolvimento da ciência brasileira e o avanço do combate ao câncer.



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