São Paulo, quarta-feira, 05 de março de 2008

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MELCHIADES FILHO

Nova fronteira

BRASÍLIA - O cálculo político de Álvaro Uribe é tão preciso quanto a trajetória dos projéteis que cruzaram a fronteira para explodir os terroristas que se escondiam (hospedavam?) no Equador. Sua figura e seu discurso só fazem sentido em uma Colômbia dividida. Com o ataque, o presidente virou protagonista da novela então estrelada por Hugo Chávez. Garante mais verbas e armas dos EUA. Quem sabe, um apelo para prolongar o mandato.
Por sua vez, as Farc, se estivessem de fato interessadas em uma distensão, não soltariam os reféns em um conta-gotas teatral e sádico.
Nem exigiriam, como precondição, a total desmilitarização da região da Colômbia onde hoje tocam seus negócios. Não são ingênuas a ponto de acreditar que o adversário aceitaria criar o Farquistão. Seu objetivo sempre foi um só: arrastar apoio para sufocar o governo eleito.
Chávez busca um alvo. Perdeu a condição de mirar a elite de seu país desde que antigos aliados se juntaram a ela para impedir que ele ampliasse os poderes por meio de referendo. Como a Guiana não oferece resistência à hegemonia venezuelana -e o Brasil é poderoso e ao mesmo tempo ausente demais-, restou ao coronel olhar para o oeste.
A violação à soberania nacional não fez senão legitimar a pregação de Rafael Correa, de que o Equador deve se unir e mobilizar os vizinhos contra a hostilidade imperialista.
E os EUA, que enfrentavam duras críticas devido ao acúmulo de fracassos no combate ao narcotráfico, têm uma nova desculpa para manter a base na Colômbia: protegê-la de bolivarianos ensandecidos.
Há outras razões e rancores em jogo. Mas, grosso modo, a escalada de ânimos serve circunstancialmente a todos os atores da região.
O Brasil é o país certo para abrir a mediação e aquietar as "trombetas da guerra". E Lula, com suas hesitações, ambivalências e outras táticas anestesiantes, talvez seja o político certo no lugar certo.


mfilho@folhasp.com.br

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