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RUY CASTRO
A morte do monstro
RIO DE JANEIRO - Morreu no
dia 21 último, aos 82 anos, em Honolulu, o ator americano Ben Chapman. Não era famoso. Sua carreira
resumiu-se a um filme, em que ele
fazia o papel-título: "O Monstro da
Lagoa Negra", de 1954.
Chapman passava o filme todo
dentro da fantasia do monstro
-uma roupa de borracha inteiriça
coberta de escamas e algas, encimada por uma cabeça de peixe ou lagarto, com lábios grossos e olhos esbugalhados. Seu rosto não era visto
em nenhum momento. Os olhos
eram da máscara, não dele, e ele não
tinha uma única fala no filme.
Além disso, era o monstro apenas
em terra firme. Nas seqüências debaixo d'água, em que se vê o bicho
nadando (às vezes, por quatro minutos sem cortes e sem fazer bolhas), o ator era um campeão de
mergulho, Ricou Browning. Ou seja, dos 79 minutos do filme, somando-se suas aparições, Chapman ficou em cena por, no máximo, 15.
Mas seu porte fez do monstro um
dos mais elegantes do cinema.
Por algum motivo, "O Monstro
da Lagoa Negra" ficou clássico. É o
filme que Marilyn Monroe acabou
de ver em "O Pecado Mora ao Lado"
pouco antes de o vento do metrô levantar-lhe o vestido. Marilyn comenta que achou o monstro uma
gracinha. E ele era mesmo: estava
quieto no seu canto no fundo do rio
havia 150 milhões de anos, e os homens é que foram perturbá-lo.
O filme teve duas continuações,
de que Chapman não participou.
Nem precisava. Pelos 54 anos seguintes, até outro dia, viveu de aparições pessoais em eventos ao redor
de piscinas, assinando autógrafos e
posando fantasiado para fotos. Seus
15 minutos de fama duraram uma
vida inteira. Nem há registro de que
tenha tido crises de personalidade.
Assumiu-se como o monstro da Lagoa Negra e foi feliz para sempre.
Deve haver uma mensagem aí, mas
não sei qual é.
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