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CARLOS HEITOR CONY
A hora do grito
RIO DE JANEIRO - Pressionado pelos últimos acontecimentos, sobretudo
pelo escândalo Waldomiro, que lhe
tirou pontos no índice de popularidade, o presidente da República, que já
não sabia bem o que fazer para governar, parece totalmente desorientado diante dos reclames da sociedade, seja no que diz respeito ao desemprego, seja na questão agrária.
São duas velhas matrizes de reclamações, estudadas e reestudadas por
sociólogos, economistas e acadêmicos
em geral. O próprio Lula construiu
toda a sua carreira fazendo do desemprego (problema eminentemente
urbano) e da reforma agrária (problema rural equivalente) o ponto de
partida de sua atuação como líder
operário e político.
Eis que, na semana passada, descobriu a pólvora e inventou a roda,
mais uma vez, declarando que a reforma agrária é necessária, mas não
se faz no grito. Uma verdade sabida e
consabida desde os tempos em que os
reis de Portugal, para se livrar de problemas e premiar algumas pessoas,
criaram as capitanias, que, nos moldes da própria monarquia, eram hereditárias.
De lá para cá, não houve governante que não reconhecesse a necessidade da reforma no campo. Subterfúgios diversos, alguns totalmente burros, outros mais ou menos burros, foram criados para prolongar a questão agrária. Governos populistas prometeram fazer a reforma "na marra"
e se deram mal: foram depostos pelas
forças reacionárias da sociedade.
No estágio em que nos encontramos, a solução para os desesperados é
gritar, gritar e criar focos de confusão
que chamem a atenção para o problema. E o presidente, notável pela
voz que ficou rouca de tanto gritar
nas fábricas e nas praças públicas,
avisa a todos nós que a reforma agrária não pode ser feita no grito.
É fácil silenciar o grito. Ou fazendo
a reforma para valer ou instaurando
um regime de força em que ninguém
grite, a não ser nas sessões de tortura.
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