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VINICIUS TORRES FREIRE
O desarranjo brasileiro
SÃO PAULO - O sucesso eleitoral
do governo Lula deve-se em boa
parte à exploração dos limites do
arranjo social e econômico que resultou da Constituição de 1988 e de
sua reforma pelo Plano Real fernandino. Mas Lula esgotou as possibilidades desse arranjo, uma concertação de interesses a médio prazo insustentável.
Um ponto de apoio desse arranjo
é a distribuição crescente de benefícios sociais para excluídos do mercado. Outro é a apropriação excessiva de fundos sociais pela classe
média, caso das aposentadorias do
setor público e de subsídios para
educação, saúde e bens de consumo. Os juros resultantes da predominância do financismo ajudam a
aquietar os mais ricos.
Tal arranjo está perto de levar o
Estado ao limite de gastos, de taxação e de investimento. Pior, o congelamento da reforma do gasto público, politicamente confortável,
torna o governo ainda mais refém
dos representantes dos credores do
Estado, as instituições financeiras.
O financismo apóia suas reivindicações em problemas reais, como a
enorme dívida pública, mas barra o
debate de alternativas. A mudança
institucional forte no BC, por
exemplo, parou em 1999. A reforma
da dívida pública é bloqueada não
só pela miséria programática do PT
mas por interesse do mercado, que
capturou instituições decisivas para a mudança (BC e Tesouro).
A crise do Congresso paralisa um
núcleo de reforma desse arranjo social; outra fonte de paralisia são os
movimentos sociais, inertes em
parte devido ao PT. Mas a economia
e o Estado não têm mais como sustentar a continuidade dessa concertação, quase toda movida a cala-bocas políticos e sociais insustentáveis. Sem crescimento, o arranjo
brasileiro não terá de onde mais tirar dinheiro para financiar seus incentivos. Mas sem desfazer esse arranjo, sem impor perdas a setores
sociais, é difícil vislumbrar de onde
virá o crescimento.
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