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CLAUDIA ANTUNES
À moda da Guerra Fria
RIO DE JANEIRO - Em 1979, a pequena Nicarágua teve quase tanto destaque nos jornais quanto hoje têm os
atentados nos Estados Unidos e suas
consequências. Pela primeira vez em
20 anos, uma guerrilha tomava o poder na América Latina.
A Frente Sandinista prometia respeitar o pluripartidarismo e manter
a economia mista. Podia ser apenas
um discurso tático, mas o fato é que o
endurecimento tornou-se inevitável,
por causa da guerra ao novo governo,
movida pelos "contras", armados e financiados pelos Estados Unidos. Em
1990 os sandinistas deixaram o poder
desmoralizados, depois de se apropriarem de bens do Estado num escândalo conhecido como La Piñata.
O país continuava -e continua-
miserável.
Lembro disso agora não só porque
ontem aconteceram eleições na Nicarágua, nas quais o sandinista Daniel
Ortega mais uma vez disputava a
Presidência, mas também porque, na
última quinta-feira, o presidente
americano, George W. Bush, assinou
uma ordem executiva que lhe permitirá bloquear o acesso a documentos
da Casa Branca da época do governo
de Ronald Reagan.
Segundo uma lei de 1978, esses papéis deveriam vir a público agora, 12
anos depois do fim da administração
Reagan -na qual foi realizada a
operação ilegal de venda de armas ao
Irã, com o envio dos lucros para os
anti-sandinistas. Mas Bush estaria
interessado em preservar funcionários que estão de volta, em seu governo, ao mesmo tempo que se previne
da futura divulgação de documentos
sobre a crise atual.
Em 1979 estávamos na Guerra Fria
e atos terroristas dos contras, assim
como seu envolvimento com o tráfico
de drogas, eram justificados em nome do combate ao comunismo. O
mundo mudou, mas as mentalidades
nem tanto -advertências feitas pelo
governo americano contra uma
eventual vitória de Ortega em nada
diferem da retórica daquele tempo.
O exemplo é diminuto, mas não
isolado. Também no combate ao terrorismo se repetem as dicotomias
burras, os atropelos aos direitos civis
e humanos e o terror de Estado.
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