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CLÓVIS ROSSI
Fatos e "spin"
MIAMI - O pavor de todo repórter inseguro, como é o meu caso, é o de não
conseguir as informações necessárias
para preparar seu texto corretamente. Pelo menos nos Estados Unidos,
meu pânico é inverso: temo afogar-me na inacreditável quantidade de
informações que brotam de todos os
poros do gigante.
Agora, no entanto, está-se apresentado uma nova razão para pânico
-e não é apenas nos Estados Unidos, mas no mundo todo (e, a bem da
verdade, nem é tão recente): o "spin".
Vem a ser o velho (e mau) dourar a
pílula, fazer algum evento parecer
mais favorável do que de fato é.
Exemplos concretos de "spin", ambos aliás fracassados: o pessoal de
John Kerry continuar insistindo, na
TV, que era possível ganhar a Flórida
quando já haviam sido apurados
90% dos votos e a vantagem de Bush
mantinha-se inalterada em quatro
pontos percentuais havia horas.
Exemplo 2: a inacreditável teoria
de gente do PT de que foi Eduardo
Suplicy quem derrotou sua ex-mulher. É "spin" tupiniquim: pobre,
quase ridículo.
O problema não é o "spin" em si. É
o fato de que ele distorce o comportamento das fontes de informação. Antes, especialmente nos EUA, sempre
havia alguém disposto a conversar
com os jornalistas ou "off the records"
(sem que seu nome aparecesse) ou
"background" (apenas para informação do repórter).
Esse pessoal era movido, em geral,
pela noção de "accountability", ou
seja, a compreensão de que políticos
devem prestar contas ao público, sendo os jornalistas meros intermediários entre uns e outros (se honestos ou
não, é outra discussão, que não cabe
aqui e agora).
Com a disseminação do "spin", a
prestação de contas já vem enviesada
e se torna muito mais complicado
chegar ao xis da questão, seja qual for
a questão.
O que o leitor tem a ver com isso?
Tudo: no fim das contas, é ele o destinatário tanto da "accountability" como do "spin" e, portanto, tem, como
o repórter, de navegar em águas nem
sempre cristalinas.
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