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SOCIALISMO À PAULISTA
Filas intermináveis para chegar ao
litoral, filas para as compras no chamado "saldão" de uma grande loja
de departamentos ou para a liquidação de um só dia de um magazine de
Campinas, fila para matricular os filhos na escola, fila para conseguir
água no litoral, para comprar pão,
para retirar dinheiro nos caixas eletrônicos das cidades litorâneas.
Foi assim que uma parte dos paulistanos -e também dos paulistas- inaugurou 1998, exatamente um período
que se convencionou chamar de
"festas": em filas como os cidadãos
nos extintos países socialistas.
"Festas" não parece palavra apropriada para descrever as desventuras
de uma fatia significativa da população no final do ano. É verdade que
nem todas as desventuras foram impostas. Ninguém é obrigado a acordar de madrugada para ficar na fila
de uma liquidação, por exemplo.
Mesmo assim, esse tipo de comportamento, que alguns tomarão como
esquizofrênico, revela um fenômeno
algo mais complicado e que os economistas com certeza designarão como demanda reprimida.
Ou seja, há, de um lado, o desejo de
comprar um bem, qualquer que seja,
mas há, na outra ponta, a impossibilidade de realizar o desejo, a não ser
nas condições de preço especialíssimas e de curta duração das liquidações espetaculares.
Tudo o mais se enquadra igualmente no capítulo das demandas reprimidas. Em certas regiões faltam vagas
nas escolas, falta infra-estrutura no
litoral, faltam opções de lazer na
quantidade necessária para desviar
parte dos turistas para outros destinos (ou para segurá-los na capital).
Tudo somado, tem-se uma demonstração aguda de má qualidade
de vida, exatamente naquela que é a
cidade mais rica do país.
É claro que os problemas de São
Paulo não se resumem às filas enfrentadas nesse período supostamente de festas. Mas ele deveria servir, exatamente, para atenuar o estresse inevitável da vida nos grandes
conglomerados urbanos.
Serviu, ao contrário, para gerar ainda mais tensões.
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