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MELCHIADES FILHO
Crédito ou débito?
BRASÍLIA - Matilde Ribeiro fez
sua parte, claro. Flagrada no topo
do ranking dos gastos (os declarados, bem entendido), enrolou-se
com as justificativas. Recusou-se a
relatar o que comprou no free shop,
a provar que ressarciu a União e a
esclarecer por que usou o cartão
corporativo em plenas férias.
A entressafra noticiosa ajudou.
Talvez tudo tivesse sido diferente
se fosse março ou abril, quando políticos e jornalistas estaríamos atolados no debate sobre cortes no Orçamento -ou chatice parecida.
Não se pode, também, descartar o
ingrediente étnico. Não criaram a
secretaria e nomearam uma negra
justamente para forçar a sociedade
a enfrentar seus preconceitos? Natural que um escândalo como esse
suscitasse cobranças inflamadas.
Nada disso, porém, basta para explicar por que a ministra da Igualdade Racial acabou rifada tão rápido -em menos de três semanas.
Este governo não costuma se abater
com os pecados dos seus, dar bola
para a oposição/mídia ou temer o
confronto com a opinião pública.
E, no entanto, antes mesmo que a
imprensa destrinchasse as contas, o
Planalto vazou, pela ordem, que: a
auditoria das despesas já tinha sido
pedida, as conclusões iniciais eram
comprometedoras, os colegas de
gabinete estavam indignados, novas regras seriam adotadas para os
cartões e a cabeça de Matilde cairia.
Falou-se, logo, que Lula teria
aprendido com o mensalão. Mas as
revelações, durante o feriado, dando conta de que assessores do próprio presidente (e de sua família)
também fizeram a festa com os cartões indicam outra razão para tanta
diligência: evitar que se cavoucasse
mais fundo nas compras que, por
lei, requereriam licitação.
O silêncio atípico do PT diante da
fritura de Matilde; o chilique de
Franklin Martins ao saber que despesas da Presidência haviam sido
tornadas públicas; o embaraço da
Controladoria ao (não) comentar
os gastos milionários da Presidência. A novela escapou do roteiro.
mfilho@folhasp.com.br
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