São Paulo, quinta-feira, 06 de maio de 2004

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TORTURA NO IRAQUE

Pode ser verdade que a tortura não é a política oficial dos EUA para o Iraque, mas não há muitas dúvidas de que a política oficial dos EUA para o Iraque leve à tortura. O presidente George W. Bush, para tentar justificar sua injustificável invasão, criou falsos pretextos e procurou imprimir uma lógica maniqueísta ao conflito: para muitos norte-americanos, notadamente os jovens militares, tratava-se de uma luta do bem contra o mal, do "american way" contra a "barbárie islâmica".
Nesse contexto, não chega a ser uma surpresa que a mensagem transmitida pelo presidente Bush quando afirma ser preciso aplicar todos os esforços na luta contra o terrorismo soe para o jovem recruta improvisado em carcereiro em Bagdá como uma "licença para torturar".
Acrescente-se a essa lógica de insinuações e interpretações peculiares a forte carga antiárabe transmitida pelo noticiário e pelos filmes de Hollywood e temos a receita para o pau-de-arara. Não é de hoje que terroristas muçulmanos e ditadores árabes substituíram nazistas e comunistas no papel de vilões cinematográficos. E ninguém -nem nenhum grupo- é retratado tão repetidas vezes como bandido sem de fato se torná-lo no imaginário da população.
A invasão ao Iraque, que teve como um de seus pretextos a deposição de um ditador que torturava e matava na prisão de Abu Ghraib, acaba de ganhar um novo símbolo: a mesma Abu Ghraib, onde se tortura e se mata, mas agora sob gerência americana, e não mais de Saddam Hussein.
Felizmente, a reação da opinião pública à brutalidade, que começou tímida na semana passada, logo após a revelação das primeiras fotografias pela rede de TV CBS, ganhou corpo, e a responsabilidade do governo e do Pentágono nos casos de maus-tratos se transformou no principal destaque do noticiário político/militar. Espera-se que esses lamentáveis episódios dêem aos norte-americanos a oportunidade de refletir e de perceber que não são "os caras bons lutando contra os caras maus" e que o mundo é um lugar um pouco mais complexo do que o presidente Bush e o mau cinema sugerem.


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