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TENDÊNCIAS/DEBATES
Aposentadoria e equidade
HÉLIO ZYLBERSTAJN, ANDRÉ SOUZA, ANDERSON STANCIOLI e MARCELO MILAN
As aposentadorias dos funcionários públicos são maiores do que
as aposentadorias dos trabalhadores cobertos pelo INSS. Para examinar a natureza desse diferencial, um dos critérios
possíveis é comparar os benefícios recebidos pelos aposentados com as contribuições que recolheram quando trabalhavam. Um sistema de aposentadorias
é equilibrado quando paga aos aposentados o mesmo valor que arrecadou deles quando trabalhavam. Se isso valer
para cada indivíduo, então ninguém
subsidia ninguém, não há transferência
de rendas entre grupos de segurados; e
o diferencial das aposentadorias decorre do diferencial das contribuições.
Para usar esse critério e
avaliar as aposentadorias
brasileiras, recorremos aos
dados da PNAD (Pesquisa
Nacional por Amostra de
Domicílios) de 2001. Estimamos a trajetória salarial
de todos os brasileiros que
trabalham, sejam eles funcionários públicos ou segurados do INSS. Calculamos
suas contribuições, desde o
ingresso no mercado de
trabalho até o momento em que vão se
aposentar. Calculamos em seguida
quanto vão receber na aposentadoria,
durante o período de sua expectativa de
vida. Incluímos o valor das pensões dos
cônjuges após a morte dos aposentados.
Os valores das contribuições e dos benefícios foram trazidos para valor presente e permitiram que calculássemos
as alíquotas apresentadas na tabela nesta página.
Os resultados indicam que os segurados do INSS contribuem, em média,
com 21% dos seus rendimentos. Neste
valor, computamos a contribuição dos
empregados, dos autônomos e também
a contribuição das empresas. Para pagar as aposentadorias dos contribuintes
do INSS, porém, seria necessário recolher apenas 17% dos rendimentos. Portanto os contribuintes do INSS recebem
menos do que pagam. A diferença é utilizada para cobrir as aposentadorias dos
informais, que não contribuem com o
sistema. Por meio do INSS, os trabalhadores do setor formal transferem renda
para os trabalhadores do setor informal.
Se não tivessem de suportar esse ônus,
poderiam se aposentar com benefícios
mais generosos, ou então poderiam recolher contribuições menores.
Diferentemente dos contribuintes do
INSS, os funcionários públicos pagam
menos do que recebem. Para pagar suas
aposentadorias, teriam que contribuir
com 49%, mas contribuem, em média,
com apenas 16% dos seus rendimentos
(aqui computamos as contribuições dos
funcionários e das administrações estaduais e municipais). A diferença é coberta com os impostos que todos pagamos. Há, portanto, uma transferência
de renda dos contribuintes para os funcionários públicos.
Alguns críticos da reforma proposta
pelo governo Lula alegam que, enquanto as empresas privadas contribuem para o INSS, o governo não contribui para
as aposentadorias dos servidores. Se
contribuísse, eles argumentam, o sistema se equilibraria. Nossos resultados
mostram que, mesmo que o governo
contribuísse, o valor recolhido seria insuficiente para pagar as aposentadorias
dos servidores públicos. Em suma, seus
benefícios são exageradamente altos, se
comparados com suas contribuições.
Os trabalhadores do setor privado são
duplamente onerados, pois transferem
renda para os trabalhadores informais e
os funcionários públicos.
A reforma da Previdência mudará esse estado de coisas? Para responder a essa questão, fizemos uma simulação com
os nossos dados. Aplicamos as regras
contidas na "reforma Lula" para todos
os atuais trabalhadores, retroativamente, desde o momento em que ingressaram no mercado de trabalho. Calculamos o valor das contribuições que teriam recolhido e também o valor dos
benefícios que receberão quando se
aposentarem, segundo as novas regras.
Comparamos o valor presente dos dois
agregados, e o resultado aparece nas
duas últimas colunas da tabela.
A reforma do governo não terá impacto no INSS, mas atenuará o desequilíbrio no sistema de aposentadorias dos funcionários públicos. Se o relatório do deputado José Pimentel for aprovado com
a redação atual, a alíquota
necessária para pagar as
aposentadorias dos funcionários públicos se reduzirá dos atuais 49% para
27%. Por outro lado, suas
contribuições nas novas
regras aumentarão dos
atuais 16% para 18%. Portanto a reforma reduzirá a
diferença entre o que os atuais funcionários públicos recebem na aposentadoria e o que pagam para se aposentar.
Como os novos funcionários ingressarão no serviço público sob um sistema semelhante ao do INSS, a reforma
terá dois efeitos. Primeiro, produzirá
um alívio nas contas públicas, pois o
custo das aposentadorias de todos os
brasileiros será mais próximo do valor
das contribuições. Segundo, e mais importante, ao reduzir as diferenças de
tratamento entre as duas categorias de
trabalhadores, a reforma de Lula contribuirá para diminuir as transferências
regressivas de renda entre os brasileiros.
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Hélio Zylberstajn, 57, André Portela Souza, 36, Anderson E. Stancioli, 27, e Marcelo Milan, 28, são professores da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP e
pesquisadores da Fipe. Colaboraram na tabulação dos dados os pesquisadores Luís Eduardo Afonso e Priscilla Matias Flori.
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