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CLÓVIS ROSSI
Sarney, empregue minha neta
SÃO PAULO - Confesso que fiquei
até comovido com o discurso do senador José Sarney em que se defendeu do que chamou de campanha
contra ele.
Comovido como avô, quando
Sarney disse que qualquer pessoa
nessa inefável condição atenderia a
um pedido da neta para arrumar
emprego, desde que legal, para o namorado.
Eu pediria, sim, emprego para
minhas netas/namorados se precisarem quando chegarem à idade
adequada e se estiver vivo até lá.
Mas a minha emoção se desfez
quando me lembrei de que Sarney
fez empregar o namorado da neta
no Senado, ou seja, atendeu ao pedido da moça com o meu bolso, o
seu bolso, o nosso bolso.
Com um avô assim, quem precisa
de padrasto?
Essa é a grande diferença entre os
políticos, quase todos, e os mortais
comuns: o clã Sarney tem muitíssimos negócios nos quais seu coração
de avô carinhoso poderia facilmente encontrar lugar para o namorado
da neta, que é físico de formação,
especialidade que não parece essencial no Senado.
Mas nem lhe passa pela cabeça
pagar salário para o rapaz com recursos próprios.
Recorre rapidinho aos cofres públicos, até porque viveu deles a vida
inteira, o que leva a naturais confusões entre público e privado.
Não só recorre, como acha natural, legal, bacana, atender a neta
com o dinheiro do público.
Jamais lhe passa pela cabeça que
pode ser de fato legal, mas é indecoroso, e as representações apresentadas contra Sarney são todas por
falta de decoro.
Mas fique tranquilo, companheiro vovô: seus colegas do Senado, na
grande maioria, também não sabem fazer a distinção entre público
e privado, entre legal e indecoroso.
Por falar nisso, "vô" Sarney, minha
neta Natália está aprendendo a tocar violão. Não é mais útil no Senado do que um físico?
crossi@uol.com.br
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