São Paulo, Quinta-feira, 07 de Janeiro de 1999
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Gatos e "harfes"

CARLOS HEITOR CONY


Rio de Janeiro - Considero lamentável o espetáculo oferecido pelo governo neste início de segundo mandato. O saco de gatos do primeiro período continua voraz e excitado, com todo mundo querendo entrar dentro dele, disputando fatias de verbas, tamanho de ministérios etc. Não há um plano específico para nada, a não ser as obviedades dos discursos oficiais do presidente e de seus auxiliares, na base do ""Arrecuem os harfes" (mais adiante relembrarei esse plano de ""ação").
Evidente que o governo está interessado em obter mais grana para tampar os buracos provocados não por empréstimos contraídos para obras que geram empregos e desenvolvimento. A brilhante criatividade da equipe econômica não vai além da criação, ressurreição ou majoração de impostos. Tudo para cobrir os déficits que nunca são cobertos, nem mesmo pelo dinheiro com que entregaram as estatais, que foi sorvido pelo ralo dos juros da dívida externa.
Voltarei ao assunto mais vezes. Por ora, duas explicações. Nos anos 60, quando a moda entre os intelectuais era ser nacionalista, deixei claro em artigos e livros que eu não era um nacionalista ortodoxo, fundamentalista. Daí que, em matéria de privatização das estatais, considero que elas não devem ser intocáveis. Mas nem por isso podem ser vendidas da forma indecorosa com que foram entregues à cupidez do mercado.
A segunda explicação é mais amena. Houve um técnico, brilhante como FHC, que, quando o time dele estava sendo sovado (como o Brasil de hoje), tinha a fórmula salvadora de recuar os halfes -no futebol de antanho o pessoal do meio-campo tinha esse nome.
Como a prosódia do cara era precária, quando ele via as coisas pretas gritava do túnel: ""Arrecuem os harfes!". FHC tem prosódia melhor, mas lida com os "harfes" do mesmo modo. Não me espanta que haja tanta gente querendo ser "harfe" dele.


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