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ELIANE CANTANHÊDE
A culpa de cada um
LOS ANGELES - Convidada pelo Consulado do Brasil e pela USC (University of Southern California) para o
simpósio "Mulheres que Fazem a Diferença", aqui em Los Angeles, fiz a
lição de casa, com dados sobre eleições, bancadas, redações e a influência crescente da mulher no Brasil.
Pois bem, os dados foram para o lixo. Abre-se o simpósio e a primeira
pergunta da mediadora, experiente
jornalista americana, é na lata: "E essa reunião dos presidentes do Brasil,
da Argentina, da Venezuela e da Bolívia para discutir o gás?".
Tudo o que os americanos queriam
saber era de petróleo, gás, fontes alternativas de energia. Falei dos aspectos políticos e, para sorte dos ouvintes, a engenheira Laura Porto, do
Ministério das Minas e Energia, tinha todos os dados sobre combustíveis, etanol e outras fontes renováveis. A platéia ficou embasbacada
com o avanço do Brasil nessa área.
E, claro, queria saber sobre Chávez,
Morales e "what is going on" no
quintal do Tio Sam. A imprensa daqui passou de raspão pela tumultuada semana em que a Bolívia decretou
a nacionalização de suas reservas de
petróleo, botou o Exército nas refinarias da Petrobras e forçou uma reunião de emergência dos quatro presidentes para voltar a fita e "começar
do começo": conversando.
Como Chávez já é devidamente demonizado por estas bandas, e essa é a
sina de Evo Morales, o mais conveniente foi falar da origem desses fenômenos: a exploração externa, a profunda desigualdade social, a miséria
inconcebível.
Tocar nas culpas alheias já é uma
delícia, mas, nos EUA, tem um gosto
especial: o governo é o que é, mas os
cidadãos, particularmente os mais
escolarizados e os da Califórnia, adoram o autoflagelo da culpa.
Eles que não nos ouçam (nem
leiam), mas, no caso da Bolívia e de
Morales, as culpas históricas são
muito mais nossas. Nas décadas passadas, gritávamos "fora yankees" para os americanos. Hoje, os "yankees"
na Bolívia somos nós.
@ - elianec@uol.com.br
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