São Paulo, domingo, 07 de maio de 2006

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Pagar agora, viver depois


Estamos pagando agora o preço do esbanjamento e da falta de previdência e rumo do passado

ARMANDO MONTEIRO NETO

Num brilhante livro intitulado "O Valor do Amanhã", o economista Eduardo Giannetti faz uma análise interessante de uma escolha a que estamos permanentemente sujeitos: "Pagar agora, viver depois" ou "viver agora, pagar depois". Colocado na perspectiva do Estado brasileiro, esse dilema nos faz ver que os governos que administraram o país nas últimas décadas claramente preferiram a segunda opção. Temos vivido sob a égide de governantes que privilegiam o gasto imediato, sem se preocupar com os impactos futuros dessa política. Nunca se esforçaram de verdade para inverter essa situação e escolheram sempre deixar os custos de sua escolha para serem enfrentados pelas próximas gerações.
O círculo vicioso de juros altos, carga tributária em elevação e baixo crescimento econômico é conseqüência direta desse fenômeno. O Estado brasileiro gasta mais do que arrecada e se endivida para fazer frente às suas despesas correntes. Vive agora, paga depois. Com isso, absorve boa parte da poupança dos brasileiros, evitando que esses recursos sejam utilizados de forma mais eficiente pela sociedade.
Não se trata de criticar este ou aquele presidente por essa decisão. O descontrole fiscal é uma doença crônica da máquina pública. É um câncer que debilita o país e impede (ou pelo menos dificulta) seu processo de desenvolvimento. Sua cura passa necessariamente por uma transformação do paciente, por uma mudança radical de hábitos e de estilo de vida.
Deixando metáforas de lado, o que precisamos é de um Estado que gaste menos e melhor. Que reduza gastos de custeio, privilegie investimentos com capacidade de geração de crescimento e emprego, e tenha foco em suas áreas de responsabilidade por excelência, como educação e saúde. Precisamos realizar de uma vez uma reforma abrangente e definitiva, no sentido de mudar a estrutura de nossa máquina pública, reduzindo sua necessidade de financiamentos externos e otimizando seus esforços.
Nesse sentido, algumas reformas se tornam fundamentais. O déficit gerado pela Previdência é, por exemplo, um dos principais sumidouros de recursos do Orçamento da União. Seu equacionamento deveria ser uma prioridade para qualquer candidato à Presidência. Esse esforço deve ser acompanhado por uma reforma administrativa abrangente e pela racionalização do sistema tributário, com diminuição da carga sobre o setor produtivo, aumento da base de contribuintes e redução da sonegação.
O setor industrial está dando sua contribuição para o esforço de transformação do país. O Mapa Estratégico da Indústria, documento desenvolvido no âmbito do Fórum Nacional da Indústria e promovido pela CNI, estabelece um conjunto de objetivos, metas e programas que envolvem o desenvolvimento de instituições e de políticas fundamentais para liberar o potencial de crescimento da economia. E constitui também um inédito instrumento de gestão que vai permitir a correção de ações e o alerta à sociedade sobre os sucessos e fracassos em nossa rota até 2015.
As metas e os indicadores do Mapa da Indústria compõem uma espécie de painel de controle à disposição do país. Mas sua implantação exigirá um movimento amplo, com a participação de diversos setores da sociedade e de governos que tenham o compromisso de avançar no processo de modernização do Brasil.
Quem quer que seja o novo presidente terá de enfrentar esse desafio. Já perdemos, por diversas vezes, importantes oportunidades para darmos um salto rumo a um processo de crescimento sustentado e duradouro. O desempenho pífio de nossa economia nas últimas décadas é fruto do descontrole e da decisão de transferir custos para as gerações futuras. Estamos pagando agora o preço do esbanjamento e da falta de previdência e rumo do passado.


Armando de Queiroz Monteiro Neto, 54, advogado, é deputado federal (PTB-PE) e presidente da Confederação Nacional da Indústria.


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