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FERNANDO DE BARROS E SILVA
As pragas de Bento 16
SÃO PAULO - Num resumo bruto,
pode-se dizer que o grande adversário de João Paulo 2º foi o materialismo dialético. A cruzada do Vaticano contra a Teologia da Libertação e a interpretação marxista da fé
cristã foram a marca e o legado do
longo pontificado (1978-2005) do
antecessor de Bento 16.
Cruzada exitosa, que reduziu a pó
os esforços para colocar a igreja a
serviço dos oprimidos no âmbito da
luta de classes. As comunidades
eclesiais de base minguaram, o próprio jargão envelheceu.
João Paulo 2º jogou a favor da
maré. A queda do muro, a ruína do
comunismo, a vitória acachapante
da mentalidade liberal a partir dos
anos 80 -tudo isso interagiu e influenciou a guinada conservadora
da Igreja Católica.
Lembre-se que foi o então cardeal Ratzinger, nomeado prefeito
da Congregação para a Doutrina da
Fé em 1981, quem roeu os alicerces
da Teologia da Libertação.
Agora o adversário de Bento 16 é
mais difícil. Podemos chamá-lo de
materialismo hedonista. Não é só o
diabo que veste Prada, mas o papa
investe contra a civilização dos prazeres da carne e do consumo, contra aquilo que o sociólogo Christopher Lasch chamou, há quase 30
anos, de "cultura do narcisismo".
Bento 16 é ultraconservador, mas
não é um idiota. Sabe antes de nós
que sua cruzada está condenada ao
insucesso. O papa, porém, está mais
empenhado em salvar a doutrina da
fé do que em preservar fiéis. Menos
e melhores católicos -eis a divisa
de seu pontificado. Para quem vê de
fora, tal escolha resulta numa espécie de obscurantismo esclarecido.
De caso pensado, a igreja se fossiliza ainda mais em matéria de moral e costumes. Estabelece um divórcio sem volta entre o que prega e
a vida humana, demasiado humana
de seu rebanho.
Não é à toa que crescem os neopentecostais. Depois que a redenção coletiva revelou-se uma quimera, eles, e não os católicos, fizeram a
"opção preferencial pelo pobre",
mas agora no singular. Salve-se
quem puder, como mandam a época e o dinheiro.
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