São Paulo, segunda, 8 de fevereiro de 1999

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Crise sem golpe

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Os governadores de oposição podem até achar que não é hora. Mas, com o agravamento da inflação e a teimosia do governo federal em não mudar a arrogante certeza de que é o rei da cocada preta, a mobilização popular, mais cedo ou mais tarde, estará nas ruas de todo o país.
Também não adianta os colunistas governistas explicarem pela enésima vez que FHC é um gênio e os adversários dele são ignorantes e malvados.
Semana passada, creio que no dia 3, relatório do grupo G-7, citado por Clóvis Rossi, divulgava conversas que levam à especulação de que "Cardoso pode não terminar o seu segundo mandato". Não seria um impeachment, mas um caso de renúncia, diante da gravidade da situação que ele provocou.
Não se trata de credibilidade, deusa à qual FHC sacrificou o mais caro dos incensos, pago aliás por todos nós. Trata-se da própria governabilidade.
O logotipo dessa ingovernabilidade foi fartamente exibido na reunião em que dois funcionários do FMI dividiram a mesa do ministro da Fazenda na hora do anúncio de novas normas para a nossa economia.
Nem no Japão, logo após a guerra, havia mesas assim formadas pelo vencido monitorado pelo vencedor. Certo que o Japão mandou suas autoridades a bordo do "Missouri" para assinar a rendição incondicional diante de McArthur. Foi o vexame indispensável ao final da guerra. Os ministros japoneses foram ao navio trajando fraque e cartola. Tudo na maior dignidade, o vencedor respeitando o vencido.
O que estamos vendo, com essa guerra econômico-financeira travada em nosso território, custando a carne e o sangue de milhões de brasileiros, não tem nem sequer a dignidade a que o derrotado -o real- tem direito.
A atual situação não deve ser resolvida por um golpe. Tivemos um exemplo de como sair de uma crise com o episódio Collor. Por barbeiragem, ele esticou o poder até o limite do impeachment.



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