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CLÓVIS ROSSI
De classes e esperanças
MADRI - Talvez nada seja tão didático a respeito do que Elio Gaspari chama de "andar de cima" e "andar de baixo" do que o caso dos brasileiros "inadmitidos" na Espanha.
Antes, confesso que acho esse
"inadmitidos" um horror, mas tecnicamente é isso: quem nem sequer
foi admitido, não pode ser expulso,
como seria a palavra mais adequada, tecnicalidades à parte.
Voltemos ao tema central. Todos
os dias, brasileiros são inadmitidos
ao desembarcarem no aeroporto de
Barajas. No mês passado, foram
452, o que dá 15,5 por dia, já que
houve apenas 29 dias.
Ninguém nunca fala nada (nem
nós da mídia, que, de resto, nem ficamos sabendo). Basta, no entanto,
que três universitários -uma no
mês passado e dois agora- entrem
na lista de inadmitidos para que se
arme um baita escândalo e se chegue ao ponto do olho por olho/dente por dente, com a inadmissão de
espanhóis em Salvador.
Os universitários, ainda por cima,
pertencem à cobertura do andar de
cima, posto que são uma da USP e
os dois outros do Iuperj.
Nada contra o escândalo. Tenho,
no entanto, dúvidas sobre a eficácia
da represália adotada. Pode lavar a
alma de brasileiros cujos brios patrióticos estão à flor da pele, mas
não vai livrar a cara de brasileiros
que chegam a Barajas. Ao contrário,
pode provocar uma escalada de
retaliações.
O ideal -ou o possível nesse círculo de ferro- é a política espanhola para os países pobres da África:
tentar ajudá-los para evitar que
seus habitantes emigrem. Até agora, funciona precariamente, é verdade. Mas é melhor ajudá-los no
ponto de partida do que barrá-los
no de chegada.
Não vale para o Brasil, que não é
pobre, embora tenha inaceitável
quantidade de pobres. O ideal seria
que a esperança vencesse mesmo o
medo, na vida real e não só no gogó
de governantes, como demonstra o
tamanho da diáspora.
crossi@uol.com.br
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