|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIANE CANTANHÊDE
Em nome do Pai
BRASÍLIA - Neste 8 de março, Dia
Internacional da Mulher, quero fazer um agradecimento público ao
arcebispo de Olinda e Recife, dom
José Cardoso Sobrinho.
Ele calou sobre o crime hediondo
de um padrasto que estuprava a enteada desde os 6 anos de idade e a
engravidou de gêmeos aos 9. Mas
excomungou a mãe da menina e a
equipe médica pelo aborto que tenta salvar sua vida, sua essência de
criança, sua capacidade de ser feliz.
Essa inversão produziu excelentes resultados, no melhor momento: mobilizou a imprensa local e nacional e indignou milhões de pessoas na semana que antecedeu o
Dia da Mulher, expondo o quanto o
fundamentalismo religioso pode
ser não apenas retrógrado mas
cruel, desumano e, em certa dose,
também ridículo, em casos que envolvem de fato vida e futuro. Os assim, particulares. Ou os coletivos,
como a pesquisa de células tronco.
Foi uma verdadeira aula, contra o
arcebispo, a favor da menina, para
mulheres, homens, jovens, velhos,
todos os que olharam para a grande
vítima horrorizados, chocados, com
uma piedade que faltou justamente
ao "homem de Deus".
Até a CNBB teve dificuldade para
respaldar sua atitude. Numa nota
visivelmente constrangida, condena antes o estuprador (que dom José nem sequer citara), reitera a posição contrária ao aborto e não faz
uma só defesa da excomunhão.
Para dom José, estuprar crianças
é pecado, mas não muito. O que não
pode é tentar corrigir as sequelas do
estupro, acolher aquela menina,
salvar-lhe o corpo, talvez a mente,
garantir-lhe o futuro. Para ele, portanto, aborto é mais grave do que
estupro. Os médicos que o realizaram são piores do que o suspeito de
pedofilia em Catanduva (SP).
Trata-se do típico caso em que a
igreja anda para um lado, enquanto
o mundo e as pessoas, para o outro,
em sentido contrário. É assim que
seus pastores perdem seus rebanhos para as evangélicas, as espíritas, as umbandistas. Ou para o
ateísmo, puro e simples.
elianec@uol.com.br
Texto Anterior: São Paulo - Clóvis Rossi: A sharia católica Próximo Texto: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: O desprezado 13 Índice
|